MÃE
SÓ HÁ UMA -Brasil, 2016 – Direção Anna Muylaert – elenco: Naomi Nero, Daniel
Botelho, Dani Nefussi, Lais Dias, Matheus Nachtergaele, Luciana Paes, Helena
Albergaria, Luciano Bortoluzzi, June Dantas, Renan Tenca, José Muylaert
Abujamra, Antonio Haddad Aguerre, Berenice Haddad Guerre, Helena Bachur,
Marcelo Muniz Bolognesi – 82 minutos
UM
OLHAR VITAL SOBRE OS CONFUSOS LAÇOS FAMILIARES
Em tempos de se falar tanto
sobre equiparação de direitos de gênero e educação sexual nas escolas
respeitando as diferenças, é com vibrante fulgor que a cineasta Anna Muylaert
aproveita seu desde já personagem-cult, adolescente traumatizado num
cabo-de-guerra emocional entre famílias, para transgredir socialmente com
quaisquer amarras, autodeclarado com diversos protagonismos para além dos dois
nomes próprios que ostenta. Veste-se com roupas tanto masculinas quanto
femininas; assim como fica com garotas e garotos. Não quer mudar de sexo nem
negar a si mesmo a chance de experimentar o mundo com suas próprias sensações,
já que não pode confiar naquelas de que descendeu. Quando o filme parece
assentado e resolvido, vem a diretora dizer não apenas que um ser humano pode
ser múltiplo, mas que existem seres múltiplos também entre si embora de
gerações próximas. E o elenco como um todo tem pitadas (ou mais que isso) de
genialidade.
É não só o melhor filme de
Anna Muylaert, como um dos melhores filmes brasileiros dos últimos anos. O
roteiro jamais cai nas armadilhas que uma história melodramática como essa
poderia proporcionar. A primeira grande sacada foi a de aproveitar apenas o mote
da história real do jovem de Goiânia, que ganhou o noticiário na década de 1990
e ficou conhecido como “o caso Pedrinho”, rapaz que, aos 16 anos descobriu que
a mãe que o criou o roubou da maternidade onde nasceu. Em “Mãe Só Há Uma”,
Pierre descobre que na verdade se chama Felipe e que de agora em diante terá
que viver com seus pais biológicos. Um impacto brutal na vida de um adolescente
que não sabe se gosta de meninos ou de meninas, se deve se vestir como homem ou
como mulher, e nem sabe se isso importa. Tudo soa muito verdadeiro na maneira
como o filme observa essa fusão de gêneros e desejos dos jovens do século 21.
O espectador acompanha a
trajetória de Pierre (Naomi Nero), que adora pintar as unhas, tocar música com
os amigos e vive uma vida simples ao lado da mãe e da irmã. E os espectadores são
brindados com um filme emocionante que fala muito além do amor de uma família.
A diretora constrói o núcleo dramático do filme em uma série de cenas
eficientes, capazes de apresentar todas as traumáticas reviravoltas de forma
natural. Mas são as atuações que fazem dessa obra algo realmente inesquecível.
É um filme provocativo que ousa na narrativa para atender a urgência em
discutir tabus e estereótipos, principalmente no cenário atual. Anna Muylaert
propõe um novo olhar sobre as configurações familiares e construções de
identidades de gênero. O drama é tocante e energético, que transforma um tema
potencialmente seco em um estudo caloroso de questões como genética, gênero e o
verdadeiro significado de "lar". A cineasta e roteirista espia um
momento complexo e delicado com carinho e sem julgamento moral. Ao redor do
protagonista, orbitam personagens igualmente perplexos e perdidos diante de uma
situação rara. UM DOS MELHORES FILMES DO ANO E UM DOS MAIS IMPORTANTES DA
DÉCADA!!!!
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