Content on this page requires a newer version of Adobe Flash Player.

Get Adobe Flash player

quarta-feira, 30 de agosto de 2017

MINHA VIDA DE ABOBRINHA (My Life as a Zucchini / Ma Vie de Courgette) Suiça / França, 2016 – Animação – Direção Claude Barras – com as vozes de Gaspard Schlatter,  Sixtine Murat, Paulin Jaccoud, Michel Vuillermoz, Raul Ribera, Estelle Hennard, Elliot Sanchez, Brigitte Rosset, Lou Wick, Natasha Koutchoumov, Monica Budde, Adrien Barazzone, Véronique Montel, Romane Cretegny – 66 minutos

           UM BELO FILME PARA QUEM QUER SE SURPREENDER

Um dos filmes mais bonitos do ano!! Esta animação é um rico retrato da infância, aliando seriedade e leveza, sobriedade e exuberância. É um belo filme para quem quer se surpreender. Construindo um verdadeiro panorama da Europa contemporânea e das angústias que afetam as crianças dentro deste cenário socioeconômico. É um filme tocante e sensível, possibilitando um estranho e satisfatório encontro entre os sentimentos de felicidade e de dor que permeiam a vida de crianças e adultos. Ao mesmo tempo, discute-se um funcionamento social bastante pertinente em tempo de crises de refugiados e muros separando nações. Os amigos de Abobrinha são filhos de imigrantes africanos, filhas de pacientes psiquiátricos ou de casais dependentes de drogas. A tia de Camille deseja tê-la em sua casa apenas para receber uma pensão maior do governo, e a garotinha que espera ansiosamente pela mãe decide que não quer mais vê-la quando a mulher aparece à porta. Existe abertura à parte de mistério inerente a cada ser humano nesta trama sem moral da história, sem vilões nem mocinhos, sem explicações excessivas, sem obrigação do otimismo forçado. É um filme dolorosamente realista e humano.

Claude Barras anima os personagens imagem por imagem, em stop motion como se estivesse dirigindo atores verdadeiros, e imagina planos-sequências soberbos em um cenário de tristeza poética, ao mesmo tempo contemporâneo e atemporal. O apuro visual é sedutor. O colorido e as formas estranhas dos personagens acabam por transformá-los em figuras delicadas, frágeis, mas ao mesmo tempo encantadoras. No fundo, a força do filme está em sua dimensão humana. Este desenho animado não tem medo de parecer fofinho, mas, acima de tudo, o mais importante é que ele está comprometido em ser realista. “Minha Vida de Abobrinha” é um filme sobre os sentimentos mais profundos do ser humano, do abandono, da necessidade de amar e se sentir amado, mas visto sob o olhar inocente de crianças em uma situação extrema. Uma história singela e construída caprichosamente nos detalhes. Maravilhoso e belo, merece ser visto e revisto!!!


domingo, 27 de agosto de 2017

NISE: O CORAÇÃO DA LOUCURA – Brasil, 2015 – Direção Roberto Berliner – elenco: Glória Pires, Julio Adrião, Flávio Bauraqui, Fabrício Boliveira, Fernando Eiras, Luciana Fregolente, Charles Fricks, Georgiana Góes, Claudio Jaborandy, Simone Mazzer, Zécarlos Machado, Bernardo Marinho, Augusto Madeira, Felipe Rocha, Roberta Rodrigues, Roney Villela – 106 minutos  

               ELA ESTAVA À FRENTE DO SEU TEMPO E ENFRENTOU A TODOS

Uma interpretação assombrosa de Gloria Pires - indiscutivelmente a melhor atriz do cinema brasileiro - ganha força e emoção, com interessantes intervenções musicais e muito ajudado por um excelente elenco de apoio. Com certeza, um dos melhores filmes brasileiros do ano. A dignidade humana não é fácil de ser representada, pois há sempre os riscos da condescendência e da chantagem emocional. Felizmente, estes riscos foram ultrapassados. Visivelmente seduzido pela obra de Nise, o diretor faz um belo retrato emotivo cuja visão poética sobre a loucura agrada em cheio quem procura um cinema de emoção. Com a confiança de ter uma atriz de rigor a seu lado, capaz de livrar o retrato de Nise de qualquer endeusamento prévio, Roberto Berliner faz sua épica produção sobre a guerra entre médicos com o olhar atento às consequências deste conflito para a população de internados do hospital.

"Nise - O Coração da Loucura" é uma história que poderia ser facilmente contada - mas não tão facilmente sentida. O diretor contrai tudo aquilo que forma sua protagonista e nos dosa pouco a pouco sem render-se, em nenhum momento, a um registro egocêntrico. Ele presta um serviço relevante ao trazer à tona a revolução realizada por Nise, que enfrentou preconceito como mulher num meio dominado por homens. Uma eficiente cinebiografia que serve tanto para oferecer luz a um nome nacional de destaque (porém um tanto esquecido) como também como exemplo da competência dos nossos realizadores em abordar um universo específico e torná-lo universal. Glória Pires encontra em Nise uma personagem à sua altura. Numa interpretação extraordinária, a atriz constrói uma pessoa engajada com seus pacientes e entusiasmada com os métodos que ela mesma está descobrindo. De fundo, as questões políticas da época. Tudo de forma admirável. Um filme genuinamente obrigatório!!


sábado, 26 de agosto de 2017

O MENSAGEIRO TRAPALHÃO (The Bellboy) EUA, 1960 – Direção Jerry Lewis – elenco: Jerry Lewis, Alex Gerry, Bob Clayton, Sonnie Sands, Eddie Shaeffer, Herkie Styles, David Landfield, Bill Richmond (Stan Laurel), Larry Best, Cary Middlecoff, Art Terry, Frankie Carr, Joe Mayer, Pat Mack, Sarah Smith, Art Stanley, Milton Berle, Bobby Byron, Isobel Elsom, Duke Art Jr. – 72 minutos

                   JERRY LEWIS FAZ SUA ACLAMADA ESTREIA NA DIREÇÃO 

Stanley é um atendente em um hotel. Atrapalhado, vive causando problemas no lugar, ainda que pouco chame atenção para si mesmo como pessoa. Certo dia, porém, se hospeda no lugar uma estrela de cinema: o comediante Jerry Lewis. Com notória semelhança com o serviçal, os encarregados do hotel e a equipe do ator vão fazer algumas confusões entre os dois.

Imagine assistir a um filme onde a primeira cena, antes mesmo dos créditos de abertura, é de um homem em um escritório que se diz ser “o produtor executivo responsável por todas as produções feitas na Paramount”. Ele diz que antes de mostrar o filme, é preciso explicar uma coisa: “O filme que você está prestes a assistir não é comum como os que têm sido apresentados ao público do cinema atualmente. É só um pouco diferente, pois não tem nenhuma história e nenhum enredo. Na verdade, é uma série de sequências tolas ou, pode-se dizer, um diário visual de algumas semanas na vida de um verdadeiro louco”. Em seguida, o tal produtor executivo cai numa gargalhada tão insana quanto o resto do filme.   

Jerry Lewis, o maior e mais importante nome da comédia norte-americana escreveu, produziu, dirigiu e estrelou esta impagável película. Só o fato de ele exercer todas as principais funções de um filme sem noção como esse, já diz muito sobre o seu estilo. Percebemos sua inclinação para um tipo de filme que dispensa enredo, sendo constituído principalmente de situações que não estabelecem relações necessárias para com a trama ou entre si. Jerry Lewis convidou alguns atores do seu gosto para participações especiais, entre eles Milton Berle, Jack Kruschen (que faz o papel daquele produtor executivo citado acima, que aparece na cena introdutória do filme). Mas, infelizmente, a principal dessas participações especiais não aceitou o convite alegando idade avançada. Trata-se de Stan Laurel (o Magro, de “O Gordo e o Magro”). No entanto, ele se ofereceu para dar conselhos e sugestões durante a produção do filme, uma vez que era a estreia do Jerry Lewis na direção. Há que se destacar, que o próprio personagem título do filme é uma grande homenagem a Stan Laurel, pois o mensageiro trapalhão possui várias características semelhantes as do Magro, como o assobio, e até o seu nome: Stanley.  Para quem curte um humor de ótima qualidade este filme é imperdível. Merece ser conferido!! 


sexta-feira, 25 de agosto de 2017

O REI DOS MÁGICOS (The Geisha Boy) EUA, 1958 – Direção Frank Tashlin – elenco:  Jerry Lewis,  Marie McDonald, Sessue Hayakawa, Suzanne Pleshette, Nobu McCarthy, Barton MacLane, Robert Hirano, Ryuzo Demura, The Los Angeles Dodgers, Carl Erskine, Alec Guinness (archive footage – uncredited), Tsunagorô Rashômon, Brad Brown, Mike Mahoney – 98 minutos

                    NO PAÍS DO SOL NASCENTE AS MAIORES CONFUSÕES

Mais uma das impagáveis comédias da grande lenda de Hollywood - Jerry Lewis. Com uma história simples, uma performance irretocável como sempre ele apresentou e um elenco pouco conhecido, porém correto, tem-se aqui uma boa diversão para quem quer apenas entretenimento. 


Jerry Lewis é um mágico desajeitado (o grande Wooley) que, sem emprego e dinheiro, aceita uma oferta do governo e das forças armadas norte-americanas de viajar ao Japão com o objetivo de entreter as tropas de soldados que lá estão para combater a guerra. Sofrendo com as diferenças culturais entre EUA e Japão e arrumando diversas confusões com militares e com outros artistas, Wooley não é levado à sério por ninguém. Até que Mitsuo, um tristonho garotinho japonês, se encanta com o mágico e inicia com ele uma bela e pura relação. Merece ser conferido. Não deixem de ver!! 



quarta-feira, 23 de agosto de 2017

DE CANIÇO E SAMBURÁ (Hook, Line and Sinker) EUA, 1969 – Direção George Marshall – elenco: Jerry Lewis, Peter Lawford, Anne Francis, Pedro Gonzalez Gonzalez, Jimmy Miller, Jennifer Edwards, Eleanor Audley, Henry Corden, Sylvia Lewis, Phillip Pine, Katheleen Freeman, Felipe Turich – 91 minutos

                      A HISTÓRIA DE UM PESCADOR DE “ÁGUAS TURVAS”

Para homenagear um dos maiores comediantes do cinema e um dos maiores mitos da Sétima Arte – Jerry Lewis -, que morreu no domingo passado (20.agosto.2017), cabe relembrar “De Caniço e Samburá”, que apesar de um tom mais amargo e menos caricato do que as plateias estavam acostumadas, esta é também uma deliciosa comédia do grande mestre do riso. Na época do lançamento, o ator já tinha 43 anos e buscava manter seu espaço no coração dos americanos, uma vez que a sua fórmula antiga começava a dar sinais de desgaste, tendo em vista que a década de 1960 começou a ter grandes mudanças na história do cinema. Na divertida história um paciente chamado Fred Dobbs, prestes a ser operado em um hospital no Chile, relembra sua vida como Peter Ingersoll, um vendedor de seguros da Califórnia passando por dificuldades, com sua esposa, Nancy e os dois filhos pequenos. 
“De Caniço e Samburá” (Hook, Line and Sinker) foi o último filme dirigido por George Marshall, o diretor que dirigiu Jerry Lewis em seu primeiro filme para as telas, “A Amiga da Onça”. O ano era 1949 e naquele período o comediante iniciava uma bem sucedida jornada no cinema. Vinha de um tremendo sucesso que fazia nos palcos, ao lado de outro grande talento, Dean Martin. A dupla se manteve por 11 anos e separaria algum tempo depois, mas os dois seguiriam carreira solo. Uma curiosidade sobre as filmagens: os cenários externos da casa de Peter e sua família foram feitos na casa utilizada para a série “A Feiticeira”. O conjunto foi projetado no final da década de 1950 e usado em outros filmes como “Maldosamente Ingênua” (1959) e sua sequência e pela série “Jeannie é um Gênio”. Basta observar os detalhes. Essa comédia do Jerry lembra bastante o que estava em voga na época, como o que era feito por Doris Day e Lucille Ball. Cabe destacar que 1969 foi um período de turbulência, a velha Hollywood dava adeus e chegava uma série de novos cineastas liderados por Steven Spielberg, Brian De Palma, Martin Scorsese etc. Na comédia, nomes como Woody Allen e Mel Brooks mudariam a fórmula ao se fazer filmes hilariantes. Nesse campo, figuras como Jerry Lewis, que foi rei nos anos anteriores, sofreu um pouco para manter seu padrão. Mas ele preferiu continuar fazendo o que sempre fez. Grande diversão!! Recomendado!!


domingo, 20 de agosto de 2017

PLANETA DOS MACACOS: A GUERRA (War For The Planet of The Apes) EUA, 2017 – Direção Matt Reeves – elenco: Andy Serkis, Woody Harrelson, Steve Zahn, Karin Konoval, Amiah Miller, Terry Notary, Toby Kebbell, Ty Olsson, Michael Adamthwaite, Gabriel Chavarria, Judy Greer, Sara Canning, Devyn Dalton, Aleks Paunovic, Alessandro Juliani, Max Lloyd-Jones, Timothy Webber, Lauro Chartrand, Roger Cross, Chad Rook – 140 minutos 

                            PELA LIBERDADE, PELA FAMÍLIA, PELO PLANETA!!

Depois de três anos de longa espera finalmente a parte final desta grande saga. Neste radicalíssimo exercício de niilismo diante da intolerância nossa de cada dia, o ambiente do progresso industrial dá lugar a uma luta quase medieval. E, nela, nosso coração bate por César e seus ideais de preservação. "Planeta dos Macacos - A Guerra" traz uma jornada sóbria, tensa que passa de um filme de vingança a uma narrativa saborosa sobre a fuga. O diretor espertamente combina tudo isso através da figura de Caesar, concluindo a saga que começou com "Planeta dos Macacos - A Origem" (2011). Há uma cena no filme que é mais vívida e assustadora do que qualquer coisa que se tenha visto em um blockbuster de Hollywood nos últimos tempos, é um momento de clareza cinemática excitante e terrível da qual o espectador espera não se libertar nem tão cedo.

"Planeta dos Macacos: A Guerra" pode ter o corpo de um filme de ação, no entanto tem a alma de um drama artístico e o cérebro de um suspense político. Tenso, impactante, emocional, familiar, o filme é tudo isso. Mas o principal elogio vai para a ainda impressionante computação gráfica em fusão com a interpretação magnífica de Andy Serkis. O olhar humanizado do animal enfrenta o olhar bestializado do homem. E, como todo bom filme de ação, "Planeta dos Macacos – A Guerra" não tem apenas ação. Esta é mesclada a momentos de repouso e mesmo de reflexão, de modo que a dramaturgia possa funcionar. Por isso, fala mais do que aparentemente diz. O filme conta com um talento incomum na direção de Matt Reeves, que sabe transformar o espetáculo pirotécnico em drama humano, com ênfase marcante nas trocas de olhares entre personagens.
Esse terceiro filme da série é tão bom quanto seus predecessores: uma aventura arrojada e abrangente contada com confiança e intensidade. Mais uma vez, Matt Reeves é um dos raros diretores de blockbusters que conseguem criar épicos em grande escala sem abandonar a intimidade e as relações dos personagens. Repleto de inteligência emocional, a textura humana distingue este filme do resto da saga. O título pode sugerir uma batalha intensa, mas o enredo privilegia o drama em lugar da ação. Isso não significa, porém, perda de qualidade. Superior ao episódio anterior, o longa-metragem tem uma história profunda e metafórica ao enfocar o embate entre símios e humanos. Um dos grandes filmes do ano!!!!


sábado, 19 de agosto de 2017

OS GUERREIROS PILANTRAS (Kelly’s Heroes) EUA, 1970 – Direção Brian G. Hutton – elenco: Clint Eastwood, Telly Savalas, Donald Sutherland, Carroll O’Connor, Don Rickles, Harry Dean Stanton, Gavin MacLeod, Hal Buckley, Jeff Morris – 146 minutos.

                      NENHUM DELES É FLOR QUE SE CHEIRE… 
                                                           MAS VALE A PENA CONHECÊ-LOS!!

Grande aventura de guerra, com cuidada reconstituição de época. Passado durante a Segunda Guerra Mundial, entre os anos de 1939 e 1945, com locações na Iugoslávia, fazendo as vezes de campo francês.



Clint Eastwood e um elenco de astros de Hollywood estão juntos nesta divertida comédia, mostrando um grupo de soldados preparados para sair da Segunda Guerra Mundial com muito dinheiro. Eastwood interpreta o Tenente Kelly, o líder desses guerreiros americanos, que decide esquecer que existe uma guerra e roubar 14 mil barras de ouro no valor de 16 milhões de dólares, que estão em um banco atrás das linhas inimigas. Mas para conseguir concretizar esse audacioso plano, Kelly precisa contar com a ajuda de um bando de soldados (Telly Savalas, Donald Sutherland, Don Rickles e Carroll O´Connor), muito mais malucos do que ele. Ninguém sabe se o plano vai dar certo. Mas será muito divertido ver esses guerreiros pilantras tentando. O filme marcou época quando do seu lançamento lá no início da década de 1970, no extinto Cine Comodoro Cinerama, aqui em São Paulo. O filme merece ser conferido, não só pela presença de Clint Eastwood, mas por sua divertida história, direção competente e seu tema de relevância. Muita diversão num dos grandes filmes da carreira de Eastwood.



quinta-feira, 17 de agosto de 2017

CINEMA NOVO – Brasil, 2016 – Direção Eryk Rocha – documentário – Depoimentos de Nelson Pereira dos Santos, Cacá Diegues, Joaquim Pedro de Andrade, Glauber Rocha, Leon Hirszman, Ruy Guerra – 90 minutos

                   O CINEMA NOVO A PARTIR DO PRÓPRIO CINEMA NOVO

Uma ótima oportunidade para se conhecer a história do Cinema Novo, movimento nacional e cultural cinematográfico que revolucionou toda uma geração de cineastas inovadores. O Cinema Novo foi um grande movimento cinematográfico brasileiro, influenciado pelo Neorrealismo Italiano e a Nouvelle Vague francesa, com reputação internacional. É um panorama exato de um cinema engajado, que confrontou o público com os espaços abertos, a luz natural e as imagens catárticas, urgentes e, ocasionalmente, messiânicas de um Brasil real e repleto de geografias contrastantes. O documentário de Eryk Rocha brilha ao mostrar o porquê do esvaziamento desse movimento, a partir do golpe militar. Chega a ser de uma ironia cínica o fato de, no mesmo ano em que o golpe tenha ocorrido, dois filmes nacionais terem sido selecionados para a mostra competitiva do Festival de Cannes – “Deus e o Diabo na Terra do Sol” e “Vidas Secas” -, outro para a Semana da Crítica (“Ganga Zumba”) e mais um para o Festival de Berlim (“Os Fuzis”). Foi ao mesmo tempo o ápice do movimento e também o início de seu esvaziamento, graças ao boicote interno promovido pelo governo de forma a separar (ou ao menos dificultar) o trabalho daquele grupo de cineastas tão unido e participativo.


Com as pontas amarradas em uma rima elegante que traz uma montagem com vários personagens de diversos filmes correndo em diversas cenas, este excelente documentário parece estar ressaltando para o espectador como o país e seu Cinema seguem disparados mesmo diante de todos os problemas. E com tantos momentos históricos na década de 1960, como o golpe e o miolo da revolta artística, os diretores se esforçaram em trazer arte e vida ao período. Como disse o crítico e cineasta Eric Rohmer “Todo filme é um documento de sua época”, o que casa perfeitamente bem com a motivação dos cineastas. Para aqueles que não estavam lá na época do Cinema Novo para ter a experiência por si próprios, "Cinema Novo" é o filme certo. Todos os registros sobre importantes capítulos da história do cinema poderiam ser evocativos como esse filme. Um belo documentário poético com edição caprichada e que não deixa de ser "um filme do cinema novo" brasileiro. O aspecto utópico, “militante” e “revolucionário” talvez colaborasse para que o povo não quisesse se ver de modo conflituado na tela, resultando mais no pessimismo.

O uso de cenas de filmes e entrevistas de época lhe traz uma riqueza impressionante, não apenas pelo aspecto técnico mas pela própria realidade retratada. Eryk Rocha resolveu fazer algo diferente, mostrar o que foi o Cinema Novo a partir do próprio Cinema Novo. A partir dos seus filmes constrói um relato denso e poético se valendo da memória cinematográfica de quem os assiste. Os trechos das obras, muito bem editadas nos enxutos 90 minutos de projeção, não são identificados com legendas e deixam o público livre para uma experiência quase sensorial e impactante. Montador e diretor, trabalhando em parceria, buscaram, mais do que uma organização temporal ou didática, dar um sentido à escolha de cenas entre 500 horas de material, incluindo os filmes dessa geração iluminada. Por todos estes motivos, “Cinema Novo” é um belo filme que não só explica o que foi o movimento, como lhe dá corpo, voz e coração.



domingo, 13 de agosto de 2017

MÃE SÓ HÁ UMA -Brasil, 2016 – Direção Anna Muylaert – elenco: Naomi Nero, Daniel Botelho, Dani Nefussi, Lais Dias, Matheus Nachtergaele, Luciana Paes, Helena Albergaria, Luciano Bortoluzzi, June Dantas, Renan Tenca, José Muylaert Abujamra, Antonio Haddad Aguerre, Berenice Haddad Guerre, Helena Bachur, Marcelo Muniz Bolognesi – 82 minutos

                 UM OLHAR VITAL SOBRE OS CONFUSOS LAÇOS FAMILIARES 

Em tempos de se falar tanto sobre equiparação de direitos de gênero e educação sexual nas escolas respeitando as diferenças, é com vibrante fulgor que a cineasta Anna Muylaert aproveita seu desde já personagem-cult, adolescente traumatizado num cabo-de-guerra emocional entre famílias, para transgredir socialmente com quaisquer amarras, autodeclarado com diversos protagonismos para além dos dois nomes próprios que ostenta. Veste-se com roupas tanto masculinas quanto femininas; assim como fica com garotas e garotos. Não quer mudar de sexo nem negar a si mesmo a chance de experimentar o mundo com suas próprias sensações, já que não pode confiar naquelas de que descendeu. Quando o filme parece assentado e resolvido, vem a diretora dizer não apenas que um ser humano pode ser múltiplo, mas que existem seres múltiplos também entre si embora de gerações próximas. E o elenco como um todo tem pitadas (ou mais que isso) de genialidade.

É não só o melhor filme de Anna Muylaert, como um dos melhores filmes brasileiros dos últimos anos. O roteiro jamais cai nas armadilhas que uma história melodramática como essa poderia proporcionar. A primeira grande sacada foi a de aproveitar apenas o mote da história real do jovem de Goiânia, que ganhou o noticiário na década de 1990 e ficou conhecido como “o caso Pedrinho”, rapaz que, aos 16 anos descobriu que a mãe que o criou o roubou da maternidade onde nasceu. Em “Mãe Só Há Uma”, Pierre descobre que na verdade se chama Felipe e que de agora em diante terá que viver com seus pais biológicos. Um impacto brutal na vida de um adolescente que não sabe se gosta de meninos ou de meninas, se deve se vestir como homem ou como mulher, e nem sabe se isso importa. Tudo soa muito verdadeiro na maneira como o filme observa essa fusão de gêneros e desejos dos jovens do século 21.


O espectador acompanha a trajetória de Pierre (Naomi Nero), que adora pintar as unhas, tocar música com os amigos e vive uma vida simples ao lado da mãe e da irmã. E os espectadores são brindados com um filme emocionante que fala muito além do amor de uma família. A diretora constrói o núcleo dramático do filme em uma série de cenas eficientes, capazes de apresentar todas as traumáticas reviravoltas de forma natural. Mas são as atuações que fazem dessa obra algo realmente inesquecível. É um filme provocativo que ousa na narrativa para atender a urgência em discutir tabus e estereótipos, principalmente no cenário atual. Anna Muylaert propõe um novo olhar sobre as configurações familiares e construções de identidades de gênero. O drama é tocante e energético, que transforma um tema potencialmente seco em um estudo caloroso de questões como genética, gênero e o verdadeiro significado de "lar". A cineasta e roteirista espia um momento complexo e delicado com carinho e sem julgamento moral. Ao redor do protagonista, orbitam personagens igualmente perplexos e perdidos diante de uma situação rara. UM DOS MELHORES FILMES DO ANO E UM DOS MAIS IMPORTANTES DA DÉCADA!!!!


quinta-feira, 10 de agosto de 2017

OS MENINOS QUE ENGANAVAM NAZISTAS (Un Sac de Billes) França / Canadá / República Tcheca, 2017 – Direção Christian Duguay – elenco: Dorian Le Clech, Batyste Fleurial, Patrick Bruel, Elsa Zylbersrein, Bernard Campan, Kev Adams, Christian Clavier, César Domboy, Ilian Bergala, Emile Berling, Jocelyne Desverchère, Coline Leclère, Holger Daemgen – 100 minutos

               DURANTE O PERÍODO DE OCUPAÇÃO NAZISTA NA FRANÇA...

Com um enredo encantador, é um filme sensível e modesto – prova disso é o plano aberto do trem à noite. Comovente em diversos momentos e com um enredo fascinante, é uma belíssima jornada de amadurecimento. Baseado no livro autobiográfico de Joseph Joffo lançado em 1973, “Os Meninos Que Enganavam Nazistas” (no original, Un Sac de Billes ou Um Saco de Bolinhas de Gude, brinquedo que assumirá o símbolo de resistência da criança judia) mostra a Segunda Guerra Mundial pelos olhos de dois irmãos que precisam ir de Paris até a Zona Livre da França, onde deveriam encontrar-se com seus pais e irmãos mais velhos. Dirigido por Christian Duguay, o filme traz claras referências à primeira adaptação desta história para o cinema, em 1975, mas em outros aspectos, flerta com a visão que o diretor Louis Malle trouxe para a França ocupada em “Adeus, Meninos” (1987), tendo, igualmente, a perspectiva de crianças judias sobre o conflito. O caráter de road movie bélico e a inevitável dualidade desse olhar infantil — mesmo diante do momento histórico há oportunas e excelentes cenas de humor — tornam os personagens muito cativantes e próximos de nós, de modo que é impossível não se apegar à história e não se emocionar quando os irmãos ou família sofrem e são separados mais outra vez.


Há dois eixos condutores no filme: de um lado, o afeto entre os dois irmãos e, de outro, a guerra e suas consequências. Jo e Maurice nutrem com pureza ímpar o amor fraterno: brincam e tiram sarro um do outro, mas também se protegem mutuamente no momento mais difícil de suas vidas. São crianças, agem como crianças, desconhecendo algumas expressões adultas e demonstrando bastante inocência (o caçula em especial) em diversos momentos – Jo, por exemplo, trata um desconhecido com simpatia, ignorando o período hostil. Entretanto, os dois precisam amadurecer rapidamente: é uma necessidade que a guerra trouxe. É justamente a proteção mútua que permite que amadureçam, algo que apenas uma narrativa tão rica poderia contar. Consciente, o diretor não tem a pretensão de inovar, apenas contenta-se em executar de maneira correta a transposição da saga dos Joffo para o cinema em forma de aventura infantil que substitui os perigos da natureza selvagem pelos alemães. Os nazistas, introduzidos desde o início como antagonistas, são em geral hostis – em oposição aos amigáveis fascistas italianos –, mas seus notórios atos cruéis mal chegam à tela. A opção é pela suavização e simplificadora personificação do mal num vilão caricato, oficial desconfiado e impiedoso interpretado por Holger Daemgen.
Algumas cenas são tensas e emocionantes. Quando o pai é obrigado a bater em Joseph para ele "esquecer" que é judeu, para protegê-lo, Patrick Bruel revela-se inesperadamente comovente como figura paterna. Com um roteiro bem amarrado que permite a fluidez narrativa, apesar de conter alguns momentos de superficialidade, é uma obra que prima por sua direção de arte, fotografia, montagem e figurino. O diretor sabe da força do material e não exagera no sentimentalismo – embora a trilha sonora seja quase onipresente e excessiva – e confia especialmente no olhar infantil diante das atrocidades. As lembranças são embaladas por perigosas aventuras e suspense, e por certa leveza por causa da atuação dos ótimos atores mirins. O peso da guerra e a caça aos judeus, porém, perseguem os protagonistas como um fantasma sempre à espreita. Com muita ternura e humor o registro da epopeia dos irmãos e de sua família por esse período conturbado faz uma bela reflexão sobre os horrores da guerra ao colocar a narrativa sob o olhar de uma criança. É um filme importante para termos outras visões sobre um dos momentos mais importantes da história do mundo.



terça-feira, 8 de agosto de 2017

DUNKIRK (Dunkirk) Inglaterra / EUA / França / Holanda, 2017 – Direção Christopher Nolan – elenco:  Fionn Whitehead, Tom Hardy, Mark Rylance, Harry Styles, Kenneth Branagh, Damien Bonnard, Aneurin Barnard, Jack Lowden, Lee Armstrong, Barry Keoghan, James Bloor, James D’Arcy, Tom Glynn-Carney, Tom Nolan, Michael Fox, Cillian Murphy,  Johnny Gibbon, Luke Thompson, Michel Biel, Constantin Balsan, Billy Howle, Mikey Collins, Dean Ridge, Bobby Lockwood, Will Attenborough, Adam Long, Matthew Marsh, Miranda Nolan, Bradley Hall, Brett Lorenzini, Jack Cutmore-Scott, Brian Vernel, Elliott Tittensor, Kevin Guthrie, Richard Sanderson, Charley Palmer Rothwell,  John Nolan, Bill Milner, Paul Riley Fox (não creditado), Michael Caine (voz da Rádio – não creditado), Jack Gover (não creditado), Christian Janner (não creditado), Davey Jones (não creditado), Jan-Michael Rosner (não creditado), Michiel van Ieperen – 106 minutos

              É O MAIS EXATO DE TODOS OS GRANDES FILMES DE GUERRA!!


“Dunkirk” é excelente e notável, entre outras coisas, em sua proposta visual. O diretor tem plena consciência dos ângulos, lentes e movimentos de câmera adequados para provocar a máxima experiência de tensão. O cenário da guerra é captado de maneira ao mesmo tempo grandiosa, pela amplitude das praias, mares e céus, e também intimista, por se focar em dramas humanos pontuais, silenciosos, envolvendo a vida de anônimos. As cenas de Tommy (Fionn Whitehead) correndo com uma maca pela praia, agarrando um barco em movimento ou se escondendo entre as vigas de um píer são muitíssimo bem filmadas e montadas. O projeto também impressiona pela ousadia narrativa e comercial. O diretor cria uma história dividida em três vertentes, cada uma com um protagonista: o garoto Tommy tentando fugir da praia, o patriota Dawson (Mark Rylance) indo voluntariamente à batalha, e o piloto Farrier (Tom Hardy) tentando destruir aviões inimigos. A trama demora em conectá-los, e não revela imediatamente a ambiciosa relação de temporalidade entre os três segmentos. O resultado é um projeto sem protagonismo definido, com poucos atores famosos, em trajetória não linear, e que não perde tempo explicando particularidades da guerra.

Um dos grandes trunfos de “Dunkirk” está em seu diretor e roteirista não permitir que o espectador fique relaxado a qualquer momento, colocando-os lado-a-lado com os soldados aflitos pela possibilidade de jamais serem resgatados. Enquanto um raio de esperança brilha para aqueles que esperam a evacuação, outra fonte de tensão é inserida no arco narrativo do piloto, por exemplo, criando, dessa forma, inúmeras quebras de expectativas que faz a plateia sentir tão desolada quanto aqueles homens na praia, à mercê da sorte de não serem atingidos pelos constantes bombardeios de aviões alemães. O filme é efetivamente um dos maiores do gênero já rodados, cuja escala grandiosa do episódio histórico que emoldura a trama não asfixia as tragédias individuais de seus personagens. Ao contrário: o espetacular e o íntimo combinam-se na tela com harmonia e eloquência raras. As atuações são sólidas e poderosas, com atenção aos detalhes e qualidade técnica inegável. Está sendo aclamado como um dos melhores filmes do diretor e do ano, graças à forma como retrata o heroísmo, mostrado com pequenos atos aparentemente comuns. Como um todo, "Dunkirk" gera comparações com as obras de Stanley Kubrick e Steven Spielberg, apesar de não possuir uma visão tão clara e consciente da terrível aleatoriedade da guerra como "O Resgate do Soldado Ryan". Há uma excelência na parte técnica, nos excelentes e precisos efeitos visuais, na lindíssima fotografia, na arrebatadora direção de arte e nos figurinos impecáveis. Com certeza, este espetáculo ganha por ser diferente. Por ser um filme de guerra único. Por ser muito mais uma experiência do que uma história propriamente.

Christopher Nolan cria para o espectador a sensação de estar dentro dos acontecimentos, como se fosse um dos soldados acuados na praia, um dos pilotos dos caças, um dos passageiros dos barcos de salvamento. Ele coloca o espectador o mais perto possível da ação, para sentir a necessidade de sobrevivência. De certo modo, é um olhar frio e distante sobre uma operação militar, mas a urgência das cenas humaniza os personagens, mesmo que a gente não saiba o nome deles. O “espírito de Dunquerque” passou a significar a resistência a qualquer custo e os elos de aço de uma comunidade solidária. No individualismo acirrado de nossos dias, esses valores são virtualmente impensáveis. A crítica internacional colocou o cineasta no mesmo patamar de grandes mestres da Sétima Arte, como Stanley Kubrick, Martin Scorsese, Terrence Malick, Spike Lee, Steven Spielberg etc. E essa empolgação toda porque é o filme em que mais se nota o amadurecimento de Christopher Nolan. Impressionante e visceral em termos de impacto físico, o filme tem sequências marcantes que se aproximam dos laureados "O Resgate do Soldado Ryan" (1998), de Steven Spielberg e "Além da Linha Vermelha" (1998) de Terrence Malick. A beleza de “Dunkirk”, não está em contemplar o épico e sim a fragilidade humana, seja física ou emocional, fragilidade essa que já deveria ser o suficiente para evitar qualquer um desses conflitos.


domingo, 6 de agosto de 2017


          O FILME DE GUERRA MAIS INTENSO E IMERSIVO DA HISTÓRIA


"Dunkirk" é um "tour de force" de arte e técnica cinematográfica, com uma grandeza ímpar e pouco vista no cinema. Baseado num evento histórico que consistiu na evacuação de soldados britânicos e franceses de Dunquerque, região no norte da França, conhecida como a Operação Dínamo, o filme é um eletrizante retrato de um dos mais cruciais momentos da Segunda Guerra Mundial. O diretor coloca uma lupa nesse evento da guerra e trabalha com uma verdade pouco vista nos filmes épicos. Normalmente vemos os filmes de guerra com personagens fortes, heroicos e com uma profundidade dramática muito grande, em vista daquele terror inacreditável que estão vivendo. Em “Dunkirk”, isso é completamente diferente, pois não apenas os personagens são totalmente anônimos, mas também mostra uma face da peleja muito cruel – o desespero. Os soldados da cidade de Dunquerque estavam sendo encurralados pelos inimigos, e as tropas europeias estavam tentando evacuar o local, porém as armadas germânicas estavam implacáveis, bombardeando os locais em que os soldados estavam concentrados. Há três pontos de vista diferentes. Um aviador (Tom Hardy), um civil que é convocado para resgatar os soldados daquele local e um soldado que busca voltar prá casa, após ter escapado do cerco da cidade. Nessas três variantes, o espectador acompanha um pouco do terror e das consequências que a guerra pode trazer. A maneira singular que o diretor faz a transição entre os mesmos acontecimentos, dos diferentes pontos de vista (terra, céu e mar), parece trazer o sentimento diferenciado que cada um mostra. 


Num filme com essa proporção, os efeitos sonoros trazem uma imersão bem importante para o espectador, mas o que se vê supera tudo o que já se viu nesse quesito. Em ambientes fechados, em ambientes abertos, os estampidos das armas de fogo são impressionantes e fazem crer que aquilo está realmente acontecendo. Há um medo coletivo, mas ele é solitário. A luta é entre países, mas a luta interna é muito mais cruel. Alguns filmes do gênero mostram o lado cruel e sombrio da guerra, mas poucos trabalham a vontade de continuar respirando, como “Dunkirk”. O filme mostra o lado visceral e a linha tênue entre covardia e desespero. O heroísmo não tem lugar, quando a sua vida está na mesa e muitas vezes, acabamos agindo por puro instinto, deixando de lado o certo e o errado. A lupa que o diretor coloca na vida das três pessoas, revela outro sentimento interessante – o ser humano mostra o seu melhor, nos momentos de maior dificuldade. Há autoralidade fílmica, pois como sempre há em cena os dois elementos que guiam a dramaturgia cinematográfica do diretor Christopher Nolan: culpa e necessidade de controle. Há uma mistura covalente de ambos no combustível afetivo que alimenta a fúria visual de "Dunkirk". Tenso, emocionante, profundamente envolvente e inesquecível, pode ser classificado entre os melhores filmes de guerra da década.

O diretor sempre está em busca de inovar a linguagem, ao mesmo tempo em que estimula o debate sobre questões cruciais. Em “Dunkirk”, Christopher Nolan diz claramente que ainda acredita na humanidade. É curioso, no entanto, ver uma produção de guerra “limpa”, sem sangue em demasia ou mutilações, obter forte impacto. Parte disso se deve à capacidade do roteiro de botar o espectador ali, junto, nesse episódio singular da humanidade, que poderia ter outro destino. É um filme poderoso e maravilhosamente criado com uma história a contar, evitando pornografia de guerra em favor de algo desolado e apocalíptico. Talvez o melhor filme de Nolan até agora. Pode-se dizer que  é uma obra-prima impressionista. É um filme de guerra como poucos, um dos que pode ser pintado sobre uma tela grande e expansiva, mas que transmite o todo através de momentos isolados, brilhantemente realizados e muitas vezes privados. A história é econômica e segura. Não existe um único momento desperdiçado, nem um detalhe desnecessário. Tudo é empolgante e necessário para a narrativa. Depois de “Amnésia” (2000); “Batman – O Cavaleiro das Trevas” (2008) e “A Origem” (2010) , o diretor Christopher Nolan continua surpreendendo com um cinema de fantasia. "Dunkirk", sem sombra de dúvida, é o melhor trabalho do cineasta. Sai a ficção e entra um espetáculo audiovisual realista como raras vezes o cinema produziu nos últimos anos. Espetacular e belo !!


sábado, 5 de agosto de 2017

A VIGILANTE DO AMANHÃ (Ghost in the Shell) EUA, 2017 – Direção Rupert Sanders – elenco: Scarlett Johansson, Pilou Asbaek, Takeshi Kitano, Juliette Binoche, Michael Pitt, Chin Han, Danusia Samal, Lasarus Ratuere, Yutaka Izumihara, Tawanda Manyimo, Peter Ferdinando, Anamaria Marinca, Daniel Henshall, Mana Hira Davis, Erroll Andersson, Kaori Yamamoto, Andrew Morris, Chris Obi, Bowie Chan Wing Wai – 107 minutos
 
                      O FILME É UM ÉDIPO REI NUMA TEBAS CIBERNÉTICA 


Honrando espetacularmente o espírito e a estética das adaptações animadas de Mamoru Oshii sem cair em uma repetição vazia, “A Vigilante do Amanhã” é um entretenimento inteligente. Apesar de algumas falhas e desapontamentos, o simples fato dessa adaptação existir já é uma prova de coragem da Paramount, que arriscou e conseguiu entregar um bom filme, que funciona melhor quando não comparado com a obra original. O filme é um Édipo Rei numa Tebas cibernética, de direção de arte exuberante. Major Scarlett é o Édipo. A Édipo. A esfinge foi derrotada antes de ela ser criada: a esfinge é a tecnologia que amplia os dotes físicos de mulheres e homens. Uma ficção científica vibrante, visualmente arrebatadora, permeada por questões metafísicas e estrelada por uma irresistível diva hollywoodiana. Scarlett Johansson reina como a Major. O grande mérito, sem dúvida, é o resultado visual da obra que parece ter sido tirado de um mangá pelo fiel esmero da equipe de direção de arte e efeitos visuais e logicamente também de figurinos.


"A Vigilante do Amanhã" não subestima a audiência, deixando alguns temas para interpretação após a exibição - assim como o anime de 1995. A procura pela identidade, a questão de gênero e o lugar de um ser como Major naquele mundo são discussões que o filme não responde, apenas apresenta. Há que se destacar a primorosa direção de arte, que é um mérito de um diretor praticamente desconhecido, o britânico Rupert Sanders. Nas imagens e nos sons, é um filme que utiliza de elementos de um passado próximo para constituir seu futuro, algo longe de ser inédito, mas muito interessante. Coincidência ou não, Scarlett Johansson interpretou nos últimos tempos vários personagens cuja identidade e essência humanas estão em questão. Agora, neste filme futurista, a bela atriz americana encarna uma mulher da qual só restou o cérebro. Visualmente deslumbrante e com paixão, o filme impressiona em muitas cenas, com sequências de ação incríveis, e merece uma conferida. 


Passado em 2029, o filme acompanha Major, uma mulher que após um acidente tem seu cérebro transportado para um corpo cibernético. Ela tem sentimentos humanos, mas um corpo de máquina. Enquanto busca se prender à sua humanidade, Major vê todas as pessoas à sua volta procurando ser mais robóticos, digamos assim. Ou seja, é possível ver um homem com saúde optando por um fígado aperfeiçoado apenas para poder beber mais. Major comanda um esquadrão de elite especializado em crimes cibernéticos. E terá o trabalho dificultado com o surgimento de Kuze (Michael Pitt), sujeito misterioso que parece disposto a acabar com a companhia tecnológica que criou Major e que auxilia sua equipe em missões. Ícone do cinema oriental, Takeshi Kitano rouba a cena sempre que aparece como o imponente Daisuke Aramaki, enquanto que a veterana Juliette Binoche surge na pele da Dra. Ouelet. Causou polêmica desde o início de sua produção por causa da escolha de Scarlett Johansson para viver a protagonista. Enquanto que uns atacam a opção com o selo de "whitewashing" (que é colocar um ator branco para viver um personagem não-branco originalmente), outros defendem que Major é uma robô e poderia ter qualquer cara. Contando com bons efeitos visuais, com boas sequências de ação e visualmente, conta com sequências inteiras remetendo ao japonês vale a pena conferir.