O LAR DAS CRIANÇAS PECULIARES (Miss
Peregrine's Home for Peculiar Children) EUA, 2015 -
Direção: Tim Burton - Elenco: Eva Green, Asa Butterfield, Samuel L.
Jackson, Judi Dench, Rupert Everett, Terence Stamp, Allison Janney, Chris
O’Dowd, Ella Purnell, Milo Parker, Finlay MacMillan, Hayden Keeler-Stone - 127
min
O novo filme de Tim Burton
conta a história de um jovem de vida tediosa que é convidado a adentrar em um
mundo fantástico, onde o diretor tem a chance de dar vazão à sua veia criativa
em um ambiente sombrio e, ao mesmo tempo, bastante atraente. Fascinado por uma
abordagem mais sombria, ele sempre buscou mesclá-la à fantasia não propriamente
para assustar, mas de forma a criar universos onde o bem e o mal não sejam tão
estereotipados assim. E nesta nova aventura não poderia ser diferente. Além do
requinte visual que é a marca registrada do diretor, ele adapta um livro muito
interessante que proporciona um roteiro engenhoso, sem os lapsos de ação que às
vezes caracterizam sua obra.
A trama do filme se
concentra no herói adolescente Jake, interpretado por Asa Butterfield (em ótima
atuação), o garoto de “A Invenção de Hugo Cabret” (2011), de Martin Scorsese. O
jovem é muito apegado ao avô, que morre em circunstâncias misteriosas. Após,
ele parte com o pai para Cairnholm, uma ilha do País de Gales, onde durante a
Segunda Guerra Mundial o avô morou num orfanato. Lá ele encontra uma mansão
abandonada, que abriga uma fenda temporal comandada pela srta. Peregrine (Eva
Green), cuja missão é justamente cuidar das crianças peculiares do título. A
srta. Peregrine é uma Ymbryne, que pode se transformar em ave e criar fendas
temporais, paralisando o tempo numa data específica, no caso, 03 de setembro de
1943, dia em que uma bomba nazista explodiu o orfanato na calada da noite em
plena Segunda Guerra Mundial. As crianças parecem um mostruário de tipos
estranhos como Tim Burton gosta de inserir em sua ficção. Há a garota de cinco
anos, fofinha, que é forte o bastante para levantar um carro; outra garota é
tão leve que usa botas com chumbo para não sair flutuando; há ainda outra que
coloca fogo em tudo que toca; um rapaz capaz de dar vida a bonecos e seres
inanimados; uma menina de aparência adorável que esconde na nuca, por baixo dos
cachos dourados, uma bocarra faminta; o garoto invisível é simplesmente
notável; bem construído também são os gêmeos misteriosos que ocultam seu poder,
que só é revelado em uma cena crucial.
“O Lar das Crianças Peculiares” não é o melhor
filme do diretor, mas funciona muito bem a partir do momento em que o jovem
entra na fenda. O espectador é então convidado a adentrar neste universo mágico
e um tanto quanto estranho, onde o apuro na direção de arte, figurino e
maquiagem saltam aos olhos da plateia. Tudo é bem aproveitado, explorando de
forma convincente a profundidade do local filmado. Desde o início, o filme
lembra muito o estilo de outras obras do diretor, como a sobriedade de “Edward
Mãos de Tesoura” (1990), aliada ao humor debochado de “Os Fantasmas se Divertem”
(1988) e o toque de heroísmo e fantasia de “Peixe Grande e Suas Histórias
Maravilhosas” (2003). Também há que se mencionar duas referências importantes:
dos X-MEN vêm os dons de cada personagem, que serão fundamentais na hora de
lutar contra o vilão e salvar todo mundo; e, de Harry Potter, vem o lado
lúdico, um quê de literatura infanto-juvenil e vilania ligada à mágica.
Quanto ao elenco ele seria
perfeito se não tivesse dois deslizes: Samuel L. Jackson interpreta a si mesmo
como o vilão Barron, que chama mais atenção pela cafonice de suas falas do que
pelo seu grau de maldade; e o desperdício da Judi Dench (uma das grandes
estrelas do cinema) vivendo um papel extremamente insignificante. O restante do
elenco se apresenta bastante eficiente. A história rende idas e vindas no tempo
e ganha um ritmo de ação quase alucinante no final. O confronto entre as
crianças e os monstros é cheio de sacadas muito boas. O diretor constrói um
conto de fadas permeado pelo macabro, em que principalmente os púberes se
arriscam para garantir a integridade do direito de ser diferente, de sentir-se
confortável com sua unicidade, e centraliza a atenção no garoto construindo um
fascinante universo de fábula, onde os acontecimentos podem ser entendidos,
numa chave metafórica, como alusão às agruras da Segunda Guerra Mundial e às
suas marcas.
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