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quarta-feira, 31 de maio de 2017

ALEMANHA, ANO ZERO (Germania, Anno Zero) Itália/França/Alemanha, 1947 Direção Roberto Rossellini – elenco: Edmund Moeschke, Ingetraud Hinze, Franz-Otto Krüger, Ernst Pittschau, Erich, Gühne, Hans Sangen – 78 minutos.

  ROSSELLINI CONTA UMA HISTÓRIA NUA, DESARMADA DE SUBJETIVIDADE E DEVASTADORA!!!

Este clássico é uma das melhores e mais fiéis obras do Neorrealismo italiano, refletindo a Alemanha do pós-guerra através de uma criança afogada na decadência presente naquilo que a cerca. É uma das obras máximas do diretor. Um drama impactante com um dos finais mais célebres da história do cinema. Utilizando atores não profissionais, o filme conta uma história cruel e difícil, numa época em que assuntos como a miséria e a devastação provocada pelas guerras ainda não eram abordados com tanta crueza. Rossellini conta sua história, passada na Berlim do pós-guerra, ocupada pelo exército norte americano, onde um garoto procura sustentar seus irmãos e o pai doente. O cineasta não enfeita a realidade de uma nação destruída física e moralmente. Esse belíssimo filme é a última parte da chamada "trilogia da guerra", formada ainda por ROMA, CIDADE ABERTA (1945) e PAISÀ (1946). 

A força de sua obra está principalmente em Edmund, a criança a qual o filme se desenvolve ao redor. Ele é parte desse novo grupo que nasce para o mundo ao redor, assim como uma nova Alemanha morre em seu estado de podridão, para futuramente nascer de novo, contar desde o início os anos de sua nova realidade, o ano zero de transição. A criança, Edmund, é a representação perfeita da nova geração alemã. Confuso, perdido, sem ideais e amigos, vagueando pela cidade desmoronada como se não houvesse para onde ir e gerando algumas das imagens mais fortes do cinema neorrealista em seus passeios solitários pela Berlim em destroços, sendo visível o estado emocional tênue e de tímida tristeza que habita a alma do garoto. Sua família desestruturada se apoia nele e em seus trabalhos ilegalmente remunerados para que haja garantia da sobrevivência à miséria e que o dinheiro para despesas seja ganho, refletindo o peso de responsabilidades na mente ainda em fase de amadurecimento de Edmund e a esperança dos mais velhos nos novos indivíduos que vão surgindo para sustentar uma Alemanha decadente. Um filme absolutamente notável, realista e incrivelmente realizado! 
A dramaticidade não se dá pelo sensacionalismo, pela trilha sonora, pela montagem, ou por alguma situação clímax. A dramaticidade está sempre presente no retrato frio e cruel da cidade. No instinto de sobrevivência dos protagonistas. Nas locações reais de prédios, praças, casarões e ruas em ruínas. E, claramente, em seu final. Edmund, após distorcer os conselhos de Enning, decide matar o pai, livrando a família do peso de um inválido. Nos damos conta então, de que o desespero do menino é maior que tudo. Maior que o amor pelo próprio pai. Assim como as ruínas, cada personagem teve suas emoções destruídas pela guerra. Há, apenas, o caos. O caos nas ruas, nos sentimentos, nas atitudes. A frieza da dor, da ressaca de um combate ignorante, sem sentido. Edmund num momento perturbador pratica seu gesto mais devastador. Aquilo é maior do que qualquer um pode suportar. Na contramão do já imponente cinema hollywoodiano da época, o Neorrealismo italiano propõe uma nova estética, baseada na experiência da realidade. O filme acentua o projeto de desdramatização do cinema de Rossellini, que culminaria em VIAGEM À ITÁLIA cinco anos depois. Ao contrário de outros relatos sobre a infância em meio à guerra (ADEUS MENINOS, ESPERANÇA E GLÓRIA, IMPÉRIO DO SOL etc), este não versa sobre o processo de amadurecimento do protagonista, pois para o cineasta não existe esperança ou sobrevivência nesta situação limite. Um filme obrigatório, contundente e imortal!!

domingo, 28 de maio de 2017

O PRINCIPE E O MENDIGO (The Prince and the Pauper) Inglaterra / EUA, 1977 – Direção Richard Fleischer – elenco: Mark Lester, Oliver Reed, Charlton Heston, Raquel Welch, Rex Harrison, Harry Andrews, Ernest Borgnine, George C. Scott, David Hemmings, Julian Orchard, Sybil Danning, Preston Lockwood,  Felicity Dean, Lalla Ward, Murray Melvin, Graham Stark, Richard Hurndall, Anthony Sharp, Arthur Hewlett, Harry Fowler – 113 minutos

DOIS SERES HUMANOS DISTINTOS ENTRELAÇADOS POR UM PARADOXAL DESTINO!! 
Nunca houve um filme que reunisse tantos premiados!! A superprodução mais aguardada do ano, extraída da obra mundialmente famosa de Mark Twain!! A excitante aventura de ação para um público de todas as idades, filmada com um elenco de astros de primeira grandeza!!   

 MARK LESTER - O talento extraordinário de um astro que marcou toda uma geração

A fábula de Mark Twain sobre o filho de um mendigo e o filho do rei da Inglaterra que nasceram no mesmo dia e que doze ou catorze anos mais tarde se encontrariam para ter a surpresa de que um era o sósia do outro e ao trocarem roupas e identidade para uma fantasia do Baile de Máscaras no palácio, acabaram dando aos conspiradores da Corte oportunidade rara para as suas lutas de poder. Em 1937 já houve uma bem sucedida versão dirigida pelo competente William Keighley, com o então recém-descoberto e endeusado Errol Flynn no elenco, que lá fazia o papel do alegre Miles Hendon, aqui tornado enfurecido justiceiro pela virilidade “porco chauvinista” de Oliver Reed. No filme anterior, o príncipe e o mendigo eram interpretados por dois verdadeiros e típicos meninos, os gêmeos Billy e Bobby Mauch. Nesta versão de 1977 a interpretação ficou por conta, graças à trucagem, por um já muito crescido e talentoso Mark Lester (o astro do belíssimo “OLIVER!”, vencedor do Oscar de Melhor filme de 1968). Esta produção, suntuosamente realizada, merece ser vista e revista, por ter um trabalho ricamente elaborado, uma fotografia primorosa, a trilha sonora de Maurice Jarre inesquecível, uma direção de arte extraordinária, além da excepcional performance do elenco estelar. UM FILME EXTRAORDINÁRIO!! UM FILME ABSOLUTAMENTE BELO!!



sábado, 27 de maio de 2017

O PODER DA CORAGEM (Neerja) India, 2016 – Direção Ram Madhvani – elenco: Sonam Kapoor, Shabana Azmi, Yogendra Tikku, Abrar Zahoor, Jim Sarbh, Ali Baldiwala, Vikrant Singta, Hayder Ali, Rohit Assija, Freny Bhagat, Sonal Paresh Borkhatariya, Rajan Chhabra – 122 minutos

                  A SUA CORAGEM SUPEROU TODAS AS FRONTEIRAS!!

Neerja é um retrato da vida da corajosa comissária de bordo Neerja Bhanot, que sacrificou sua vida protegendo 359 passageiros do voo 73 da Pan Am, em 1986. O voo, que ia de Mumbai, na Índia, para os Estados Unidos, foi sequestrado por quatro integrantes da organização terrorista Abu Nidal, que tinham a intenção de lançá-lo contra um prédio em Israel. Apesar de alguns pontos negativos, o filme é muito bem produzido e tem momentos com boas doses de tensão sobre a história de coragem da protagonista, que colocou sua vida em risco, para salvar centenas de pessoas. Uma verdadeira lição de vida, especialmente em tempos de tanto egoísmo.


Neerja é um retrato da vida da corajosa comissária de bordo Neerja Bhanot, que sacrificou sua vida protegendo 359 passageiros do voo 73 da Pan Am, em 1986. O voo, que ia de Mumbai, na Índia, para os Estados Unidos, foi sequestrado por quatro integrantes da organização terrorista Abu Nidal, que tinham a intenção de lançá-lo contra um prédio em Israel. Apesar de alguns pontos negativos, o filme é muito bem produzido e tem momentos com boas doses de tensão sobre a história de coragem da protagonista, que colocou sua vida em risco, para salvar centenas de pessoas. Uma verdadeira lição de vida, especialmente em tempos de tanto egoísmo.

quarta-feira, 24 de maio de 2017

INTERNET, O FILME – Brasil, 2017 – Direção Filippo Capuzzi Lapietra – elenco: Rafinha Bastos, Felipe Castanhari, Pathy dos Reis, Gusta Stockler, Cellbit, Julio Cocielo, Maurício Meirelles, Gabi Lopes, Thaynara Oliveira Gomes, Christian Figueiredo, Igão Underground, Lucas Teddy Olioti, PC Siqueira, Victor Meyniel, Cauê Moura, Mr. Catra, Raul Gil, Jacaré Banguela, Palmirinha Onofre, Mr Poladoful, Tacio Schaeppi, Paulinho Serra – 97 min

           EM UM MUNDO DE WEBCELEBRIDADES TUDO PODE ACONTECER

Acima de questões técnicas, é preciso encarar este filme como o retrato de uma época. Goste-se ou não, os youtubers são uma realidade e, de certa forma, é até natural que se busque algum modo de migrar (e lucrar) tamanha fama para as telas de cinema - basta lembrar os vários astros da TV que seguiram o mesmo caminho. A grande questão é que, dentro desta migração, são transferidas não apenas pessoas, mas também vícios estilísticos e de linguagem - e, neste caso, a decisão é bem ame ou odeie. O filme é recheado de bons números de humor feitos por profissionais, mas ele tem um ponto fraco. O ponto fraco é que, como a maioria das webcelebridades não tem experiência, as atuações são engessadas. E há piadas boas e inteligentes, mas que são ofuscadas pelo roteiro fraco e machista.

Na sinopse, vários influenciadores e seus fãs estão reunidos em um hotel de São Paulo, para uma grande convenção que acontecerá nos próximos dias. É o gancho para um imenso painel representativo do universo de youtubers, que surgem em suas variadas facetas: o arrogante, o que esconde o rosto, o casal que faz sucesso, o que depende da fama de um animal, a que fala verdades a todo instante, o vulgar, o que sempre xinga, o feito em animação e por aí vai. Mais do que glorificá-los, o filme tem por objetivo identificá-los em um misto de apresentação aos leigos e reconhecimento daquele meio aos entendidos, até mesmo com uma certa autocrítica. Neste ponto, o filme funciona a contento.

Com histórias variando entre o ameno e o constrangedor (especialmente a que envolve o cachorro Brioco), pontuado por algumas piadas escatológicas,  INTERNET – O FILME consegue ser uma boa comédia. Uma delas está no pós-créditos, na divertida cena envolvendo Mr. Catra como Deus, e nas espertas piadas envolvendo as provocações a Felipe Neto, o suposto casal formado por Kéfera e Alexandre Frota e a breve aparição do frame típico da Jequiti Cosméticos, nas transmissões do SBT. São momentos como este, em que ri do próprio universo retratado, que o filme encontra um caminho a seguir. Como nem tudo poderia ser apenas bom humor e alto nível, há momentos de homofobia, gordofobia e afins – algo que parece vir no pacote de nove entre dez das comédias nacionais. Há também momentos (na verdade, boa parte deles) nos quais os atores parecem estar se divertindo mais do que o público. A direção de Filippo Capuzzi Lapietra sabe utilizar muito bem do material que têm em suas mãos. Há uma clara intenção do diretor em remeter a estética do filme à do Youtube, mais jovial e dinâmico. A inclusão de memes e uma edição mais ágil é perfeitamente encaixada no longa, que tem desde a sua abertura um público alvo determinado. Auxiliado com o roteiro de Rafinha Bastos, algumas piadas mais referenciais são bem engraçadas. A participação de PC Siqueira, no arco de Cellbit, é muito boa e bem feita. A inclusão de memes mais antigos como a presença ilustre dos cantores da versão original de “Para Nossa Alegria”, é uma jogada de risco, que funciona exatamente por ser arriscada. Mas no geral, o filme pode lhe arrancar uma quantidade boa de risadas, ainda mais se o espectador estiver enraizado nessa cultura e for capaz de entender todas as referências.


domingo, 21 de maio de 2017

A FITA BRANCA (Das Weisse Band / The White Ribbon) Alemanha, Austria, França, Itália, 2009 – Direção Michael Haneke – Elenco: Christian Friedel, Leonie Benesch, Ulrich Tukur, Ursina Lardi, Burghart Klaussner, Rainer Bock, Susanne Lothar, Josef Bierbichler – 144 minutos

   UMA FÁBULA SOMBRIA E ASSUSTADORA SOBRE AS RAÍZES DO NAZISMO
        UM DOS MELHORES FILMES DE TODA A HISTÓRIA DO CINEMA!!!

É uma história sombria, mas de esperança e redenção. Às vésperas da Primeira Guerra Mundial, em 1913, estranhos eventos perturbam a calma de uma pequena cidade na Alemanha. O espectador é apresentado a todos os integrantes dessa sociedade: o barão, o administrador, o padre, o médico, o professor, a babá, entre outros que viviam em aparente tranquilidade, até que os estranhos episódios começam. Uma corda é colocada como armadilha para derrubar o cavalo do médico; um celeiro é incendiado; duas crianças são sequestradas e torturadas. Gradualmente, estes incidentes isolados tomam a forma de um sinistro ritual de punição, deixando a cidade em pânico. O professor do coro de crianças e jovens da escola local investiga os acontecimentos para encontrar o responsável e aos poucos desvela a perturbadora verdade. O diretor aplica a relação de crime e castigo de CACHÉ para a Alemanha pré-nazista. Esse filme poderoso fala sobre questões bem mais gerais, que podem ser aplicadas a qualquer país e a qualquer tempo: a hipocrisia das pessoas, a podridão que se esconde por trás de quem mais se preocupa com as aparências, as consequências do modo violento como alguns pais criam seus filhos etc. 
Um dos pontos que mais chamam a atenção é que, em muitas cenas, talvez na maioria delas, o diretor não mostra os momentos de violência física de forma direta: se a surra acontece dentro da sala, ele filma apenas a porta fechada; se uma jovem é violentada, ele filma apenas o choro posterior ao ato em si. Em outras palavras ele sugere mais do que mostra, pondo o foco não na ação, mas em seus efeitos, na tensão e no ambiente brutal que eles causam. Assim, até em um aspecto formal, ou técnico, o filme representa aquela sociedade em que os atos condenáveis são feitos de forma escondida, mas suas consequências são totalmente visíveis. Do premiado cineasta Michael Haneke, de A PROFESSORA DE PIANO e CACHÉ, o perturbador e belo A FITA BRANCA foi o vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes de 2009. O filme ainda recebeu o Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro e era o favorito ao Oscar 2010 na mesma categoria (mas perdeu absurdamente), além de receber uma indicação como melhor fotografia, para Christian Berger. Apesar de ter sido totalmente filmado em cores, A FITA BRANCA foi alterado para branco-e-preto durante a pós-produção. O diretor procura a origem do crime de ódio mais filmado e analisado do século 20 - o Holocausto. O vínculo com o nazismo é montado já na fala do narrador, que conta que ali, naquela comunidade, pequenos eventos prenunciam o que aconteceria com o país todo, anos depois. Haneke começa o filme, portanto, amarrado conscientemente nessa analogia com o Holocausto - e, ao seu modo habitual, começa a ditar o tipo de reação que espera do público.

O fato é que a punição, embalada como disciplina, está enraizada no vilarejo - e a fita branca do título, que o pastor local força dois de seus filhos a usar, como sinal de vergonha por pecados cometidos, é obviamente a antevisão da futura etiquetação antissemita de judeus nos princípios da Segunda Guerra. Costuma-se crer que Hitler chegou ao poder auxiliado pelo rancor que os alemães sentiam após a devastação do país na Primeira Guerra, mas para Haneke o embrião do mal é anterior. Se A FITA BRANCA está preso à analogia com o nazismo, pelo menos a exerce com lampejos de brilhantismo, como no plano final, da missa na igreja, com sua arquitetura que lembraria depois um salão do Terceiro Reich. Pode ser visto como uma crítica profunda a vários tipos de autoritarismo. Por isso, é o tipo de filme para o qual espectadores atentos poderão encontrar diversas interpretações. Com um elenco excelente, sobretudo as crianças; um enredo brilhante, que  vai se construindo de maneira perfeita; uma edição rigorosa, e apesar do filme ser longo, não há cenas sobrando; e uma fotografia em preto e branco, soberba e magnífica, é UM DOS MELHORES FILMES DO ANO!!! UM DOS MAIS IMPORTANTES DA HISTÓRIA DO CINEMA!!! ABSOLUTAMENTE NOTÁVEL, BELO E EXTRAORDINÁRIO!!! OBRIGATÓRIO!!


sábado, 20 de maio de 2017

O NASCIMENTO DE UMA NAÇÃO (The Birth of a Nation) EUA, 2016 – Direção Nate Parker – elenco: Nate Parker, Armie Hammer, Penelope Ann Miller, Jackie Earle Haley, Mark Boone Junior, Colman Domingo, Aunjanue Ellis, Dwight Henry, Aja Naomi King, Esther Scott, Roger Guenveur Smith, Tony Espinosa – 115 minutos  

       ELE DECIDIU ELABORAR UM PLANO E LIDERAR O MOVIMENTO DE LIBERTAÇÃO


"O Nascimento de uma Nação" já deixa seu legado e nenhum passado negro ou polêmica pessoal será capaz de apagar. No entanto, foi uma pena que a mancha do passado pessoal do diretor e ator Nate Parker desviou a importância merecida da obra na época das premiações. Embora o filme seja desigual às vezes, especialmente no terceiro ato, ele ainda atinge momentos de incrível beleza e terror à medida que assistimos a Turner liderando uma rebelião violenta e necessária contra o pecado da escravidão. Mas o filme lava com sangue a alma de uma enorme parte da população que já deu, faz tempo, sua cota de sofrimento na Terra. E Nate Parker soube aproveitar com maestria os simbolismos para ir à forra. O envolvimento do ator com o personagem é tão evidente – transborda da tela – que, ele merecia ser indicado ao Oscar 2017 por sua performance, mas os membros da Academia ignoraram.
De todo modo, tropeços à parte, "O Nascimento de uma Nação" é capaz de despertar reflexões nem que seja apenas pela própria natureza do tema que aborda. O filme é potente, tem interpretações seguras e brilhantes, mas o diretor estreante e de primeira viagem, que também escreveu o roteiro, embarca com muita sofreguidão nos excessos de um tom novelesco para um filme que se pretende uma crônica de vingança. Sua direção é um tanto dura, desprovida de sutilezas, tamanha é a vontade da lembrança. Mas ele extrai excelentes atuações do elenco de apoio, e é ele quem segura o filme com emoção aflorada. Resumindo, o filme retrata um capítulo importante da história dos Estados Unidos de maneira incompleta, mas bastante interessante.


sexta-feira, 19 de maio de 2017

A LONGA CAMINHADA DE BILLY LYNN (Billy Lynn’s Long Halftime Walk) Inglaterra / China / EUA, 2016 – Direção Ang Lee – elenco: Joe Alwyn, Kristen Stewart, Garrett Hedlund, Chris Tucker, Vin Diesel, Steve Martin, Arturo Castro, Mason Lee, Barney Harris, Beau Knapp, Ben Platt – 113 minutos  

ELE SE TORNOU UM HERÓI, 
                             MAS ISSO NÃO IMPEDIU QUE VOLTASSE À GUERRA

Ang Lee, cineasta de filmes extraordinários como O BANQUETE DE CASAMENTO (1993); RAZÃO E SENSIBILIDADE (1995); O TIGRE E O DRAGÃO (2000); O SEGREDO DE BROKEBACK MOUNTAIN (2005), traz sua extraordinária versão do aclamado romance best-seller, “A Longa Caminhada de Billy Lynn”. A história do filme é contada através do ponto de vista do soldado de 19 anos, Billy Lynn (interpretado pelo novato Joe Alwyn) que, junto com seus colegas do esquadrão Bravo, se torna um herói após uma angustiante batalha no Iraque e é trazido de volta ao lar para uma turnê de vitória. Através de flashbacks, que culminam no espetacular show de intervalo do jogo de futebol americano do feriado de Ação de Graças, o filme conta o que aconteceu realmente ao esquadrão; fazendo um contraste entre a realidade da guerra e a percepção americana sobre ela. O elenco do filme conta com Kristen Stewart, Chris Tucker e Garret Hedlund, e também com Vin Diesel e Steve Martin. O diretor usou uma nova tecnologia nessa produção, filmando com um número de frames extremamente alto pela primeira vez na história do cinema, para criar uma experiência digital imersiva que o ajudou a dramatizar uma situação de guerra como nunca antes visto.

Além de belas imagens, que contrastam os horrores da guerra com uma celebração repleta de fogos de artifício, os vídeos destacam o elenco incomum da produção falando da experiência das filmagens, que usa o que há de mais avançado em tecnologia de captação de imagens digitais. Ang Lee usou tecnologia 3D de ponta para fotografar em altíssima definição, criando uma experiência descrita como “imersiva” e que os vídeos da internet não são capazes de transmitir. As críticas publicadas nos EUA celebraram a revolução visual, mas não foram muito elogiosas para o roteiro de Simon Beaufoy (“Quem Quer Ser um Milionário”). Tematicamente maduro e tecnicamente seguro, o filme é um discurso/crítica, sútil e preciso, direcionado a uma nação que glamouriza a Guerra e faz desta uma bandeira/venda para mascarar as implicações morais dessa Política disfarçada de "serviço a liberdade".

quarta-feira, 17 de maio de 2017

ASSASSINO A PREÇO FIXO 2 (Mechanic: Resurrection) EUA / França, 2016 – Direção Dennis Gansel – elenco: Jason Statham, Jessica Alba, Tommy Lee Jones, Michelle Yeoh, Sam Hazeldine, John Cenatiempo, Toby Eddington, Femi Elufowoju Jr., Anteo Quintavalle, Bonnie Zellerbach, YaYaying Rhatha Phongam, Stuart Thorp, Alex Kuzelicki, Thomas Kiwi – 98 minutos

ELE PRECISA CUMPRIR A DIFÍCIL TAREFA DE ASSASSINAR 
                                                                             OS HOMENS MAIS PERIGOSOS DO MUNDO 

“Assassino a Preço Fixo 2" (2016) é o filme que "Assassino a Preço Fixo" (2011) deveria ter sido - um filme B de James Bond ou uma versão mais homicida e crua de "Missão Impossível" (1996). Para aqueles que adoram Jason Statham, a experiência é bastante divertida. O filme não é de se jogar fora por completo graças às elaboradas e estruturadas sequências de ação e ao carisma matador de Jason Statham. Ele é, com certeza, o grande astro de ação da atualidade. Assim como aconteceu com Jean-Claude Van Damme, Chuck Norris e até Arnold Schwarznegger, o ator britânico tem um público cativo pronto para ver suas longas e improváveis cenas de ação; no entanto, esse fator é o mesmo que leva Statham a estar sempre no mesmo filme, como se houvesse pouca diferença entre este e os outros mais recentes do ator.


O filme apresenta o que realmente está interessado, os seus momentos de pura ação. E aí está a grande ideia do filme, para rever seu grande amor Bishop precisará cometer três assassinatos improváveis e que não aparentam ser um crime. É então que o filme se diverte, e talvez por isso que divirta em alguma instância, colocando o herói nas situações mais complicadas, como chegar a um homem poderoso dentro de uma cadeia de segurança máxima; ou assassinar um milionário cercado de seguranças que vive literalmente no alto de uma torre de vidro impossível de se chegar; ou ainda penetrar uma fortaleza do período da URSS no Leste Europeu. Nessas missões, o mais interessante é que o filme não se leva a sério, não estando preocupado com verossimilhança alguma, Bishop desafia as leis da física e parece mais um super-herói do que qualquer outra coisa. São essas situações que deixam “Assassino a Preço Fixo 2” minimamente divertido. A direção de Dennis Gansel é segura e consegue trazer algo diferente do que foi visto no filme anterior. Com alguns problemas, o filme traz algo potencialmente maravilhoso: o ponto final dessa franquia que deveria ter permanecido fechada com o filme estrelado por Charles Bronson. 

terça-feira, 16 de maio de 2017

PEQUENO SEGREDO – Brasil / Nova Zelândia, 2016 – Direção David Schurmann – elenco: Júlia Lemmertz, Marcello Antony, Maria Flor, Erroll Shand, Fionnula Flanagan, Mariana Goulart, Michael Wade, Thomas Silvestre, Ryan James, Régius Brandão – 107 minutos

                                     UM AMOR MAIOR QUE A VIDA 

Com certeza é um filme que irá falar mais com o público do que com os críticos, já que grande parcela da população responde bem a este tipo de formato. “Não comece com este melodrama latino”, dispara a preconceituosa avó de Fionnula Flanagan a certa altura. E a ironia está implícita. "Pequeno Segredo" não tem o peso e nem a imponência que se esperava do candidato ao Oscar 2017, mas sua escolha para representar o Brasil foi pensada estrategicamente, e claro para prejudicar “AQUARIUS”, que é infinitamente superior. Resta saber se a Academia ainda se apegará aos velhos formatos de se fazer drama. O filme escolheu navegar por uma onda tipicamente hollywoodiana que tem como meta dourar a pílula de sofrimentos com paisagens naturais deslumbrantes e forte carga de exotismo. Nada contra isso. O problema está na falta de vitalidade e na monotonia narrativa sob insistente e meloso fundo musical. A trama se desenvolve por tempos justapostos, passado e presente. Não é coisa fácil de fazer no cinema. E as soluções encontradas pelo roteiro não são muito felizes. 

“Pequeno Segredo” se desenvolve em duas linhas narrativas, uma que dá conta do presente de Kat (Mariana Goulart); outra que desenvolve o passado de seus pais; num hábil trabalho de montagem de Gustavo Giani. Embalado por uma trilha tocante e ao mesmo tempo pesada, pelo excesso do uso, do cultuado Antonio Pinto (AMY), o filme segue como se espera para o “formato”: um melodrama carregado. Sensível, bem realizado (destaque para a fotografia de Inti Briones) e com ótimas interpretações femininas (a garota Mariana Goulart está muito bem), o filme desperta alguma simpatia. Com uma direção de arte caprichada e fotografia que nos remete aos quadros protagonizados pelos Schürmann no “Fantástico”, “Pequeno Segredo” é uma produção sobre a importância do amor e da família, mas que desperdiça seu potencial por optar pelo tom melodramático açucarado. A direção de David Schurmann, ainda que tecnicamente competente, se mostra extremamente convencional e sem traços autorais visíveis, exceção feita a raros lampejos de criatividade estética. É uma pena!! 


domingo, 14 de maio de 2017

A PONTE DO RIO KWAI (The Bridge on the River Kwai) EUA, 1957 – Direção David Lean – elenco: William Holden, Alec Guinness, Jack Hawkins, James Donald, Sessue Hayakawa, André Morell, Geoffrey Horne, Peter Williams, John Boxer - 161 minutos.

     UM DOS MAIORES FILMES DE TODOS OS TEMPOS COMPLETA 60 ANOS 


Em seus épicos intimistas, David Lean sempre foi considerado um estudioso do comportamento humano. O seu personagem típico é um alienado - como o militar interpretado por Alec Guinness em A PONTE DO RIO KWAI. Prisioneiro dos japoneses num campo do Pacífico, ele resiste altivamente ao comandante Sessue Hayakawa, convencido da superioridade intelectual e moral que lhe confere o fato de ser cidadão britânico. Em seus filmes, o diretor David Lean historiou a grandeza e a derrocada do Império Britânico. O personagem interpretado por Hayakawa - ator japonês lendário, que fez carreira em Hollywood nos anos 1920, quando manteve com o latin lover Rodolfo Valentino o affair amoroso que Nagisa Oshima tentou, mas não conseguiu, transformar em filme - também acredita na superioridade nipônica. O choque desses dois temperamentos é inevitável. Alec Guinness aceita construir uma ponte sobre o Rio Kwai com toda a eficiência da engenharia britânica. Quer provar que realmente pertence a uma cultura superior, sem se dar conta de que a referida ponte será usada para o transporte de tropas e armamentos dos japoneses, portanto, contra os ingleses. Entra em cena o oficial norte-americano interpretado por William Holden. Pragmaticamente, ele vem para destruir a ponte, já que se trata de peça vital do sistema japonês de segurança. Cria-se um novo choque, entre Holden e Guinness, que não suporta a idéia de ver destruída a obra de sua vida. Culmina na explosão do desfecho, quando uma expressão, repetida diversas vezes - "Madness" (Loucura) -, resume o que Lean quer dizer sobre a guerra e os homens. O cineasta foi um grande narrador clássico e aqui está uma das melhores amostras disso. 


O filme foi rodado na Inglaterra e no Sri Lanka. Os autores do roteiro, Carl Foreman e Michael Wilson, estavam na "lista negra", acusados de pertencer a organizações comunistas, pelo que tiveram de trabalhar secretamente, e sua contribuição não foi credenciada na primeira versão. Por essa razão, o prêmio Oscar de Melhor Roteiro Adaptado foi concedido unicamente a Pierre Boulle, autor da novela original, que nem sequer sabia inglês. Em 1984, a Academia concedeu um prêmio póstumo aos dois roteiristas. Em 1992, foi relançado em vídeo com os novos créditos do roteiro, corrigindo uma injustiça histórica. Cary Grant e Laurence Olivier estiveram cotados para o papel do "Coronel Nicholson". Enquanto no filme os prisioneiros construiram a ponte em dois meses, a empresa britânica contratada cobrou 250 mil dólares para construir a referida ponte e levou oito meses para finalizá-la, usando 500 trabalhadores e 35 elefantes. A ponte foi demolida em poucos segundos na cena final do filme. John Ford e Howard Hawks estiveram cotados para dirigir o filme antes de David Lean ser finalmente o escolhido. Um dos maiores filmes de todos os tempos que está completando 60 anos.

Uma das mais belas realizações e um dos maiores clássicos da história do cinema! Uma rara combinação de filme de diversão e de boa qualidade artística. São quase três horas de suspense, coragem e demonstração da inutilidade e loucura da guerra. Mesclando às cenas de ação, um permanente e eletrizante confronto psicológico e cultural. Recebeu 8 indicações ao Oscar e ganhou sete, incluindo Melhor Filme do Ano, Melhor Diretor (David Lean), Melhor Ator (Alec Guinness), Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Fotografia, Melhor Edição e Melhor Trilha Sonora. Destaque para a fabulosa música de Maurice Jarre, fiel colaborador de David Lean. O filme tornou célebre a marcha militar assobiada pelos soldados (uma cena clássica). Esta história da construção de uma ponte sobre o rio Kwai,  em Burma, durante a Segunda Guerra Mundial, merece figurar entre os maiores épicos dirigidos pelo britânico David Lean, que era um diretor de grandes epopéias e A PONTE DO RIO KWAI é um desses pequenos milagres do celulóide, que sempre crescem a cada revisão. O confronto final é uma das melhores críticas culturais que o cinema ousou transformar em tensão. O filme foi considerado UM TRIUNFO COLOSSAL e até hoje é um dos mais cultuados filmes de guerra de todos os tempos. Obrigatório!!!




sábado, 13 de maio de 2017

UM ESTADO DE LIBERDADE (Free State of Jones) EUA, 2016 – Direção Gary Ross – elenco: Matthew McConaughey, Gugu Mbatha-Raw, Mahershala Ali, Keri Russell, Christopher Berry, Jacob Lofland (Daniel), Sean Bridgers, Bill Tangradi, Brian Lee Franklin, Thomas Francis Murphy, Kerry Cahill, Joe Chrest, Jessica Collins, Donald Watkins, Nicolas Bosc, Tim Bell – 139 min

             PARA CONSEGUIR SUA LIBERDADE, ELE LUTARÁ CONTRA TODOS 


O filme investiga os aspectos de uma história de luta e coragem durante a Guerra Civil Norte-Americana. Existem muitas questões nesse cenário e no século XIX de modo geral, que infelizmente ainda ecoam nos dias de hoje. Um dos principais méritos da produção é conseguir ser atual em seus debates e discussões. O que diz mais sobre o tempo em que vivemos do que sobre o filme em si. Esta não é uma aula de história, mas é entretenimento para as massas feito por Hollywood que respeita a história e parece nos convidar a discutir e a debater. O roteiro se desenvolve sem pressa, mantendo o ritmo da narrativa, bem como um trabalho competente dos departamentos de direção de arte e figurino, além de cenas de batalhas espetaculares. O diretor consultou alguns dos maiores especialistas no assunto e fez um bom trabalho ao equilibrar os fatos com as demandas narrativas da ficção. O resultado é uma lição de história, cujo didatismo ocasional é crucial para sua potência. O filme tem como outro mérito levantar uma discussão sobre os crimes e omissões da Reconstrução, com efeitos que se fazem sentir até hoje. O que não funciona muito bem é o recurso a uma alternância de épocas entre os acontecimentos do século XIX e um julgamento no Mississippi nos anos 1960.
"Um Estado de Liberdade" é um filme anti-guerra com uma mensagem comunista que ainda assim glamouriza o orgulho sulista e o trabalho. É uma mensagem repleta de nuances muito raras em nosso contexto político atual. A edificante cinebiografia do filme ganha energia e foge do didatismo nas mãos de Gary Ross, o diretor, que demonstra a ambição de fornecer ao mesmo tempo informação e reflexão sobre o tema histórico. Matthew McConaughey é o grande destaque do elenco, com seu carisma, dá ao protagonista uma atuação clássica. O ator se entrega ao personagem e não decepciona ao longo da sua performance. Ele também tem carisma o suficiente para assumir a função de herói ou líder revolucionário. O elenco traz ainda Mahershala Ali e Keri Russell. O filme ostenta uma amplitude digna de um épico histórico, mas se perde um pouco, infelizmente.



sábado, 6 de maio de 2017

UM DIA MUITO ESPECIAL (Una Giornata Particolare) Itália / Canadá, 1977 – Direção Ettore Scola – elenco: Sophia Loren, Marcello Mastroianni, John Vernon, Françoise Berd, Patrizia Basso, Tiziano De Persio, Maurizio Di Paolantonio, Antonio Garibaldi, Vittorio Guerrieri, Alessandra Mussolini, Nicole Magny – 105 minutos

MAIS QUE UM FILME, UM MOMENTO RELIGIOSO DA ARTE CINEMATOGRÁFICA 

Um dos filmes mais aplaudidos e cultuados do Ettore Scola. E não pode ser diferente: a execução primordial de uma história com um contexto tão pesado é tratada de forma leve, com momentos de tensão definidos de maneira irretocável. O diretor desenvolveu um filme que tem a capacidade de levantar grandes discussões (papel da mulher na sociedade, culto à personalidade e repressão) a partir de um caso que ocorre em um apartamento de Roma.  Inesquecível, que marca o legado de um grande diretor e roteirista da história do cinema. O grande diferencial do Ettore Scola foi saber construir ótimos panos de fundo para seus filmes. Isto não apenas o ajudou na distribuição internacional de seus longas, mas também é de suma importância para o espectador que não tem conhecimento da realidade italiana. No caso de “Um Dia Muito Especial”, o roteiro é montado a partir de um dos encontros mais discutidos da primeira metade do século XX, que foi a visita de Adolf Hitler à Itália de Mussolini, no dia 8 de maio de 1938. O diretor abre o filme com imagens de Hitler no trem que o transportava para Roma, retiradas dos noticiários do regime fascista. Essa base é necessária para entender não apenas o culto à personalidade em cima da figura dos dois ditadores, mas também no envolvimento da sociedade, que fazia questão de presenciar o evento.


Roma, 1938: Hitler é recebido por Mussolini para protagonizar mais um grandiloquente espetáculo fascista, uma monumental e triunfalista parada militar. A massa se veste de preto para cumprir, fascinada, a sua coreografia de morte no grande cerimonial. Esse é o pano de fundo dessa grande obra-prima. Como a lembrar que, no período, até mesmo os documentários eram usados como armas de propaganda, Ettore Scola usa as imagens de um cinejornal oficialesco para remontar àquele momento histórico. Em sua contrapropaganda, o diretor troca o grande teatro totalitarista pelo pequeno teatro da vida, lançando mão de uma estratégia um tanto brechtiana: conserva a "grande história" como fundo enquanto se detém, em primeiro plano, na "pequena história" do encontro entre uma dona de casa fascista, uma "mãe coragem" ainda sem consciência (belissimamente interpretada por Sophia Loren, sem maquiagem, para aparentar cansaço, mas mais bela e segura do que nunca), e um radialista vizinho, perseguido por homossexualismo (Marcello Mastroianni, em um grande momento de sua carreira), duas vítimas do chauvinismo fascista.
Resumindo: UM DIA MUITO ESPECIAL foi realizado em 1977, mas é ambientado em 1938, um pouco antes de estourar a Segunda Guerra Mundial na Europa. Tudo se passa em Roma. Melhor ainda: tudo se passa num único prédio romano, exatamente no dia em que o poderoso Adolf Hitler visita Benito Mussolini, consolidando a aliança que fortalecerá o nazi-fascismo e, conseqüentemente, os terríveis poderes da direita. Nas ruas, os italianos vibram de contentamento, felizes com a importante visita. Dentro do prédio, porém, duas pessoas estão céticas em relação ao momento político e preferem mergulhar nas suas próprias realidades pessoais. Ela, Antonietta (Sophia Loren), é uma dona de casa reprimida, que só tem olhos e braços para os afazeres domésticos. Ele, Gabriele (Marcello Mastroianni), um radialista desempregado e homossexual. Suas angústias individuais silenciosas contrastam com a balbúrdia das ruas. Seus olhares se cruzam e se percebem carentes. Talvez eles jamais se conhecessem, caso não tivessem ficado sozinhos, isolados do falso mundo político que enchia Roma com fogos de artifício. Enquanto isso, a câmera de Ettore Scola passeia pelos corredores e janelas do prédio, com cumplicidade no olhar. Coloca o espectador dentro do mundo do estranho casal. Nasce ali uma história de atração e repulsão como poucas e um vaivem de emoções fortes. Um grande, sensível, notável e belo filme!! Um filme extraordinário!!! 


quinta-feira, 4 de maio de 2017

O ESGRIMISTA (Miekkailija) Finlândia / Estônia / Alemanha, 2015 – Direção Klaus Härö – elenco: Märt Avandi, Ursula Ratasepp, Hendrik Toompere, Lembit Ulfsak, Kirill Käro, Liisa Koppel, Andres Lepik, Joonas Koff, Maria Klenskaja, Kaspar Tõnisson – 99 minutos
   Para se programar para o futuro, é preciso se estabelecer com o passado.
O ESGRIMISTA é sensível e muito delicado ao abortar um tema muito em voga hoje, que é a situação do refugiado político, ainda que seja dentro de seu próprio país. É impossível ficar imune à história de Endel após se propor a assistir ao filme. Retratando a história real de Endel Nelis (Märt Avandi), um famoso mestre da esgrima na Estônia, que foi obrigado a voltar a seu país, depois que a Rússia o invadiu. Endel volta para ser um professor de educação física, numa afastada cidadezinha, e utiliza de suas habilidades para ensinar uma turma de crianças de uma escola carente, a arte da esgrima, mas o diretor da instituição, começa a não gostar do sucesso do professor e busca um modo de mandá-lo embora, investigando sua vida, até que surge um campeonato exatamente em sua cidade de origem que está dominada por soldados russos, deixando o professor indeciso se leva seus alunos ou fica protegido na cidadezinha que está refugiado, a decisão se torna mais dolorosa pela relação amorosa e de cumplicidade que alunos e professor estabeleceu ao longa do tempo.

Märt Avandi que vive o mestre Endel é muito seguro e contido, na medida correta, em sua atuação, ele sem grandes sobressaltos consegue a olho nu, mostrar ao espectador, que seus alunos estão o transformando como ser humano. O elenco infantil também é magnifico, principalmente a garotinha Liisa Koppel, que vive a Marta, ela consegue apenas em seu doce olhar, transmitir muito conteúdo e por ter essa forte e marcante expressão o diretor o usa em diversas passagens ao longa da projeção. O diretor finlandês Klaus Härö, consegue empregar sua identidade cinematográfica, usando momento de criatividade e de pura poesia, sem se tornar incompreensível para um leigo espectador. Seu grande mérito é conseguir dar para sua obra um caráter popular sem se tornar uma cópia americana de blockbuster. Härö com essa obra se mostra um exímio contador de histórias, arrebatando completamente a plateia para sua proposta do início ao fim da narrativa. Foi inscrito pela Finlândia para concorrer a uma vaga ao Oscar 2016 de Melhor Filme Estrangeiro. 
O roteiro da finlandesa Anna Heinämaa preferiu usar uma narrativa épica, além de copiar a estrutura de filmes comerciais onde o embate entre um revolucionário (o professor) enfrenta o conservador (o coordenador da escola). Retratada como um esporte de pouco interesse para o regime, a esgrima, além de não ser considerada educativa para crianças, era perigosa. Além disso, ela também era vista como um esporte medieval, fazendo uma alusão ao passado comunista e soviético da Estônia. Para reforçar esta visão obtusa, a ambientação em uma cidade distante e quase abandonada, onde seus habitantes são regidos por um excesso de burocracia dentro de uma ditadura, foi pontual. O roteiro mostra claramente que havia mais divisão do que igualdade naquele microcosmo da sociedade soviética. No entanto, a grande força do roteiro reside no protagonista. Endel é um personagem denso não somente pelo passado obscuro que ele reluta em nos revelar, mas também pela dúvida que carrega entre fugir do passado ou criar uma nova vida ajudando as crianças daquela escola. E a virada mais interessante do roteiro está no fato de que é justamente a vida nova, as crianças, que o ajuda a enfrentar o passado de que ele tanto foge em Leningrado. É a mensagem do roteiro de que, para se poder viver plenamente o presente e se programar para o futuro, é preciso se estabelecer com o passado.