sábado, 19 de novembro de 2011
25º Lugar - GRITOS E SUSSURROS (Viskningar Och Rop) Suécia, 1972
OS 100 MELHORES FILMES DE TODOS OS TEMPOS!!
25º Lugar - GRITOS E SUSSURROS (Viskningar Och Rop) – Suécia, 1972 – Direção Ingmar Bergman – elenco: Liv Ullmann, Ingrid Thulin, Harriet Andersson, Kari Sylwan, Erland Josephson, Anders EK, Inga Gill, Henning Moritzen, Georg Arlin – 90 minutos.
Um filme de Bergman não cabe num registro rápido e momentâneo. Exige, no mínimo, um ensaio. Afinal, não é por nada que o cineasta sueco é estudado e discutido por psiquiatras e psicólogos - tanto ou mais do que por críticos de cinema. No máximo, uma informação pode auxiliar ao espectador menos entrosado no labiríntico universo bergmaniano a encontrar caminhos que esclareçam, ou ajudem a esclarecer, as suas proposições. É um filme hermético, e, por isso mesmo desafia o espectador que gosta de temas difíceis tratados com inteligência na tela. GRITOS E SUSSURROS concorreu ao Oscar, em cinco categorias (Melhor filme, Melhor Direção, Melhor Roteiro e Melhor Figurino; recebendo apenas um: o de Melhor Fotografia, pelo trabalho perfeito de Sve Nykvist). Como em todos os filmes de Bergman, há uma linha muito própria de visão do subconsciente dos angustiados personagens - querendo libertar-se de um mundo fechado na memória/cérebro de cada um. Lembrando ainda o lúcido comentário de um crítico: "Nesse filme estão todas as grandes linhas de pensamento e da arte bergmaniana: as influências de gênios escandinavos, de Strindgerg a Dreyer; os reflexos da formação cristã (definitivamente encerrada com a trilogia em torno do Silêncio de Deus); o existencialismo, especialmente pela vertente de Kirkegaard (já que a essência do melhor do cineasta é cultivar com paixão religiosa a dúvida de toda certeza)".
Foi o próprio Ingmar Bergman quem definiu GRITOS E SUSSURROS como um filme que se aproxima mais de um estado de alma do que propriamente de uma história a ser narrada dentro dos princípios básicos do cinema. Deixar transparecer o que se oculta sobre as formalidades das relações humanas é o objetivo dessa obra reveladora. Não que a trama envolvendo a agonia de uma mulher em estado terminal e de suas duas irmãs seja irrelevante. Muito pelo contrário. É no limiar da vida que Bergman percebe o momento das grandes revelações, aquelas abafadas pela moral, pelos costumes e pela religião. Obra de um autor maduro, o roteiro se apropria do universo das peças de Tchecov, em especial “Tio Vânia”, destrinchando o complexo universo das relações humanas, principalmente aquelas sustentadas por frágeis laços familiares. O olhar desafiador é herança não apenas de Tchekov, mas também de Ibsen, autor favorito e referência em todos os roteiros bergmanianos. Realizado em 1972, GRITOS E SUSSURROS talvez seja o filme que melhor sintetiza as preocupações estéticas e temáticas do diretor de MORANGOS SILVESTRES (1958). Foi dito talvez porque uma década mais tarde, Bergman se superaria com FANNY & ALEXANDER (1983), que além da densidade dramática é uma espécie de retrato da infância do autor. Ambos os filmes são geniais, completos e extraordinários. Em GRITOS E SUSSURROS, a agonia da personagem Ágnes (Harriet Andersson), que perpassa todo o filme, permite ao cineasta traçar um painel da impotência humana diante da morte, mesmo dilema presente em filmes como O SÉTIMO SELO (1956) e OS COMUNGANTES (LUZ DE INVERNO). O destino inexorável lança os personagens à própria sorte, ou melhor, à falta de sentido de suas vidas tacanhas, enquadradas na rigidez das normas sociais de um mundo dominado pelos machos, símbolos moral protestante, que reprime a inventividade e o desejo.
Ingmar Bergman confia às suas personagens femininas, que vivem uma espécie de exílio familiar, o caminho da salvação. A morte de Ágnes, ainda que por alguns instantes, liberta o amor contido de suas duas irmãs, a travada Karin (Ingrid Thulin) e a frígida Maria (Liv Ullmann). Já para Anna (Kari Sylwan), a criada, a morte de Ágnes representa a oportunidade de mostrar o humanismo e a compaixão intoleráveis no ambiente repressivo abordado pelo filme. Mas GRITOS E SUSSURROS é sobretudo um filme que se utiliza do requinte estético para expressar sentimentos. A fotografia do gênio Sven Nykvist em vermelho profundo, além de criar uma atmosfera onírica quase atemporal, ilumina instantes inesquecíveis de amor, ódio e ternura. Nykvist, fotógrafo de grande parte dos filmes de Bergman, reforça a idéia de clausura física e existencial, oferecendo um belíssimo contraponto na sequência final, quando irmãs e criada correm pela grama, num momento de paz, feminilidade e conforto, em que cessam os gritos e sussurros. Mas seria este um filme incompleto sem a interpretação formidável das três atrizes principais, cujas máscaras procuram justamente traduzir o indizível da alma humana. São elas, por sinal, a matéria-prima do cinema bergmaniano. GRITOS E SUSSURROS pode ser visto ainda como uma reverência àqueles que são, na verdade, a alma do seu cinema - os atores, cujas imagens na tela ratificam a utopia cinematográfica do triunfo da vida sobre a morte. Belo, inesquecível, difícil, inquietante e extraordinário, obra-prima de riqueza infinita, é um dos filmes mais perturbadores do mestre Ingmar Bergman!! É um dos mais belos filmes do cinema! Um verdadeiro estudo da angústia feminina em vermelho profundo! É uma daquelas raras experiências que o espectador carrega por toda a sua existência!! Perfeito e obrigatório!!
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