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domingo, 8 de setembro de 2013

GUERRA MUNDIAL Z (World War Z) EUA, 2013



GUERRA MUNDIAL Z (World War Z) EUA, 2013 – Direção Marc Forster – elenco: Brad Pitt, Mireille Enos, Daniella Kertesz, James Badge Dale, fana Mokoena, Ludi Boeken, Pierfrancesco Favino, Elyes Gabel, Peter Capaldi – 116 minutos. 
















Uma misteriosa doença se alastra pelo planeta, contaminando pessoas com uma velocidade impressionante. A contaminação acontece em 12 segundos. Brad Pitt, em grande forma, é o protagonista, um experiente ex-investigador da ONU, que tinha optado por curtir mais a família, mas as surpresas da vida o obrigam a mudar de ideia. Inspirado no livro homônimo de Max Brooks, GUERRA MUNDIAL Z é um eletrizante thriller de suspense e ação, e um dos mais espetaculares filmes do ano.  Dirigido pelo versátil Marc Forster, responsável por obras tão díspares quanto EM BUSCA DA TERRA DO NUNCA (Finding Neverland, 2004) e 007 – QUANTUM OF SOLACE (Quantum of Solace, 2008), o filme aposta na grandiosidade como seu maior diferencial, apresentando uma verdadeira guerra mundial contra os zumbis, com locações em diversos países e, literalmente, milhares e milhares de mortos-vivos. As cenas são impressionantes e de um impacto devastador. Sem medo de utilizar planos aéreos, exatamente com a intenção de transmitir essa escala épica, e a computação gráfica, o diretor cria instantes visualmente estarrecedores, com hordas de criaturas escalando muros gigantes e dominando cidades inteiras. São alguns dos momentos mais fantásticos que o cinema de zumbis já produziu.


O roteiro apresenta boas ideias, entre elas, uma fala notável, quando um personagem diz ao protagonista “Cada ser humano salvo é um zumbi a menos para combater”, uma frase realmente fatal em sua lógica. O roteiro, também, aponta informações das mais variadas vertentes, como questões ambientais, passando por teorias conspiratórias envolvendo Jerusalém, por exemplo, até a culpabilidade das companhias aéreas pelo contágio em massa. Como nada é perfeito, esse grande filme tem um pequeno deslize. Em certo momento, o personagem de Brad Pitt entra em contato com um zumbi e, após matá-lo, corre diretamente para a beirada de um prédio para que, caso se transforme, não ponha em risco a sua família. É uma ótima ideia, que poderia render um instante de maior impacto, mas tudo é feito de maneira tão rápida que a intenção de Gerry pode até mesmo passar despercebida. Recheado de cenas espetaculares, excelentes cenas de ação, efeitos especiais incríveis e grandiosos, cabe destacar como uma das melhores de toda a produção, aquela que se passa no laboratório, quando Forster deixa de lado a ação e acalma o ritmo, apostando na construção de um clima de suspense de verdade. Para os que curtem trilha sonora, tanto a original composta por Marco Beltrami, quanto outras da banda britânica Muse, são altamente climáticas. Mergulhe de cabeça, sem medo de perder o cérebro, e acompanhe espetacularmente essa verdadeira corrida contra o tempo. ENTRETENIMENTO DA MELHOR QUALIDADE EM SUAS QUASE DUAS HORAS DE DURAÇÃO!! COM UMA SURPREENDENTE ORIGINALIDADE, É UM DOS DEZ MELHORES FILMES DO ANO!! IMPERDÍVEL!!


domingo, 25 de agosto de 2013

O ATO FINAL (Deep End) Inglaterra / Alemanha, 1970






O ATO FINAL (Deep End) Inglaterra / Alemanha, 1970 – Direção Jerzy Skolimovsky – elenco: Jane Asher (Susan), John Moulder-Brown (Mike), Diana Dors (cliente), Karl Michael Vogler (instrutor de natação), Christopher Sandford (Chris), Louise Martini (prostituta), Erica Beer (Moça do Caixa), Anita Lochner (Kathy), Jerzy Skolimovsky (passageiro), Anne-Marie Kuster (recepcionista do nightclub) – 90 minutos.

Jovem de quinze anos de idade, de origem humilde e recém formado no colegial, não conseguindo boas colocações profissionais, consegue um emprego em um local de banhos públicos, num subúrbio de Londres, onde se torna obcecado por uma colega de trabalho. Apesar dela ser comprometida, o rapaz faz o possível para sabotar o relacionamento, a ponto de persegui-la, tornando-se cada vez mais desesperado pela  moça. Nunca um título fez tanto sentido num filme. Mas neste caso apenas quando chegamos ao final do mesmo. O ATO FINAL (Deep End) conta-nos a história de um jovem um tanto quanto incomum, com um comportamento  insólito e bizarro, ora pela apatia, ora pela obsessão que tem pelas mulheres, no segundo caso apenas por uma, ao longo do filme. 




Sem sombra de dúvida, é o melhor trabalho da dupla central (Jane Asher e John Moulder-Brown). Com um roteiro inovador, impactante e com grandes reviravoltas, uma trilha sonora inesquecível e um elenco afinadíssimo, é um dos melhores filmes da década de 1970. Jane Asher foi indicada ao Bafta, como melhor atriz coadjuvante, e merecia ganhar. Um filme realmente adolescente, saudavelmente irresponsável, visualmente explosivo e devastadoramente sensual!! Subverte várias regras do “bom cinema” e faz um trabalho de composição muito livre e recheado de sinceridade. Comer vários hot dogs, porque não se tem nada melhor para fazer, arrancar e rir de um cartaz com um homem grávido, bolar um método esquisitíssimo para achar uma jóia perdida na neve etc. A forma de filmar é absolutamente notável, uma câmera documental, os atores descontraídos e soltos, saídas muito originais. É nesse cinema, ao mesmo tempo polêmico e irreverente que o diretor faz um filme divertido, humano, poético, sensível e extraordinário.  Jerzy Skolimowski disseca as angústias musicais, sociais e sexuais de um adolescente proletarizado de uma maneira que encantou toda uma geração, permanecendo até hoje intenso.






domingo, 16 de junho de 2013

ANTES DA MEIA-NOITE (Before Midnight) EUA, 2013


ANTES DA MEIA-NOITE (Before Midnight) EUA, 2013 – Direção Richard Linklater – elenco: Ethan Hawke, Julie Delpy, Seamus Davey-Fitzpatrick – 108 minutos.

Como no anterior ANTES DO PÔR DO SOL, Richard Linklater volta à carga com um filme que extrai sua força e poder de atração de diálogos prolíficos que se estendem por longas tomadas. ANTES DA MEIA-NOITE é o terceiro longa da trilogia iniciada em 1995 com ANTES DO AMANHECER, onde fomos apresentados pela primeira vez ao casal formado pelo americano Jesse (Ethan Hawke) e a francesa Cèline (Julie Delpy), que se conheceram num trem na Europa.

Nenhum dos filmes flerta com a realidade como este terceiro. O romantismo parece arrefecido pela rotina do casal. Sim, eles continuam a travar diálogos extensos e cheios de entrosamento e sinceridade, mas havia nos filmes anteriores um quê de ingenuidade. Em ANTES DA MEIA-NOITE há uma evolução no tom dessas conversas, que mesmo de comunicação afiada, ou talvez por causa disso, não se abstêm de críticas mútuas e acusações pontuais. A relação de Jesse e Cèline evoluiu e, talvez, "evoluir" numa relação seja encaminhá-la para um inevitável desgaste e, consequentemente, para seu fim. Uma coisa é certa, a história de ambos ao longo desses anos não foi um conto de fadas como o livro que Jesse escreveu sobre os dois fez imaginar seus leitores.

Uma sequência em especial neste filme é capaz de entristecer quem acompanhou a história desse casal nas telas. Mesmo quem não viu os filmes anteriores é capaz de sentir a tensão dramática do momento pela excelente encenação. O casal vai para um quarto de hotel passar a noite juntos enquanto amigos cuidam de suas filhas. Momento raro na vida cotidiana de Jesse e Cèline que se transforma em verdadeiro inferno movido a acusações. Momento tenso que só quem não vivenciou foi quem não amou de verdade. UM FILME BELO, PARA QUEM NUNCA DESISTE DE AMAR, mas sabe que na vida real os romances não são como nas telas de cinema!!

domingo, 12 de maio de 2013

AMOR (Amour) Áustria / França, 2012



AMOR (Amour) Áustria, 2012 – Direção Michael Haneke – elenco: Jean-Louis Trintignant, Emmanuelle Riva, Isabelle Huppert, William Shimell – 126 min.

Depois do primoroso e magnífico A FITA BRANCA, aclamado em Cannes, Michael Haneke realiza um dos trabalhos mais intimistas e dá uma aula sobre o verdadeiro conceito do amor (há muito esquecida e usada de uma maneira deveras vaga). Ao contrário de muitas produções que exageram no romance sem profundidade com simples “eu te amo mais que tudo” e “não sei viver sem você”, em AMOR (Amour), o austríaco apresenta uma emotiva e dura história sobre um casal que divide o amor pela música e enfrentam um difícil desafio que nos ensina o verdadeiro conceito de cumplicidade.



Haneke opta em mostrar com dureza a degradação física e mental de Anne, e aproveita o ambiente isolado e frio que o grandioso apartamento do casal proporciona. Antes a mobília que destaca a paixão pela arte era bem destacada, e após o acidente de Anne, todo aquele lugar se tornou assombroso e solitário para Georges, que passa a enfrentar tudo sozinho.
Após sete anos sem atuar, Jean-Louis Trintignant realiza um trabalho fantástico e cativante. Como Georges, ele emprega um carisma e uma sensibilidade incrível, demonstrando o carinho e respeito pela esposa, mesmo estando ciente de que não tinha solução. Indicada ao Oscar, Emmanuelle Riva emociona e consegue transmitir todo o sofrimento de Anne. A atriz de 86 anos desempenha uma atuação grandiosa e estupenda, bem acima das outras indicadas, sendo um verdadeiro ultraje o prêmio não ter sido dado a ela.



Para dar vida a este casal, Michael Haneke escolheu a dedo seus atores: Emmanuele Riva (de HIROSHIMA, MEU AMOR) interpreta uma Anne elegante no começo do filme. A transformação dos gestos, expressões e movimentos no decorrer da história destaca uma atuação impecável. Trintignant forma o par perfeito e só retornou às telas a pedido do diretor. Enquanto isso, Isabelle Huppert entra como filha dos dois, parecendo manter a aura doentia de seu personagem em A PROFESSORA DE PIANO. Poucos são os fatos desconhecidos em AMOR. A trilogia doença, desespero e morte está presente desde o início. Há um segredo a se desvendar quando Anne é encontrada em trajes de luto e com flores ao redor da cabeça. Mas o fim já está ali. Talvez isso seja o pior. Haneke cria um estado de tensão desumano. Vemos a degradação de uma mulher junto a seu marido, que não sabe mais o certo diante da repetitiva “dor” vinda dos lábios da esposa. Suas atitudes tornam-se questionáveis ao lidar com a enfermidade do ente querido. De maneira sutil e quase rara hoje em dia – sem explicações idiotizando o espectador -, o filme expõe a doença de Anne, a independência exagerada da filha e dos netos distantes, a vergonha dos protagonistas diante da decadência. Duas horas de filme passam de forma rápida e angustiante, apesar de não haver muitas novidades. O clima tenso é ressaltado pelo vazio da casa escura, pela pomba que insiste em habitá-la, pelos tons esverdeados e degradês de cinza das roupas e fotografia. A câmera paralisada em um personagem, enquanto outro desenvolve a ação - recurso utilizado com frequência por Haneke - enfatiza a impotência em relação ao destino do outro.

OBRA-PRIMA OBRIGATÓRIA para quem gosta do bom cinema, tem bom gosto e inteligência para apreciar o filme mais comovente e belo de 2012!! O MAIOR NOCAUTE EMOCIONAL DO ANO!! Absolutamente extraordinário!!

domingo, 3 de março de 2013

OSCAR 2013 - Grandes filmes e de excelente qualidade!!






A qualidade dos filmes este ano no OSCAR foi como há muitos anos nâo acontecia. Uma seleção de excelentes filmes, aliás de grandes filmes. Mas, mais uma vez predominou os mesmos conchavos de vários anos. A Academia ainda não se livrou daquele conservadorismo e do seu velho corporativismo. Quem deveria ganhar de Melhor Filme do ano, indiscutivelmente, era AMOR, o extraordinário filme austríaco que está mexendo com as platéias do mundo inteiro. Michael Haneke realiza um dos trabalhos mais intimistas e dá uma aula estonteante sobre o verdadeiro conceito do amor, apresentando uma emotiva e dura história sobre um casal que divide o amor pela música e enfrentam um difícil desafio que nos ensina o verdadeiro conceito de cumplicidade. É o maior filme do ano e o mais importante!! Mas já era do conhecimento de todos os entendidos de cinema que a Academia de Hollywood não ia deixar de fazer propaganda de um filme americano para premiar uma obra de arte europeia. Assim, torci o tempo todo para ARGO, que para mim era o filme mais merecedor do prêmio, sem desmerecer os demais, todos como já disse de excelente qualidade. ARGO é o filme mais eletrizante dos últimos dez anos. Há muito tempo não se produzia nada tão espetacular. Seu slogan “o filme era falso, mas a missão era real” não dá a dimensão de quão extraordinário é o filme. Felizmente ele saiu vencedor. A HORA MAIS ESCURA, começou uma campanha boa, pois é um filme muito bem realizado, mesmo com o seu início meio cansativo, com os 22 minutos de cenas de tortura no Afeganistão. Mas devido a sua “polemização” na mídia, com acusações de que o filme apresentava uma imagem enganosa dos EUA, provocando a ira de senadores norte-americanos, suas chances começaram a diminuir. De favorito ele passou a azarão!! LINCOLN, desde o início começou como o franco favorito, principalmente pelo elenco impecável e a assombrosa interpretação de Daniel Day-Lewis (merecedor do seu terceiro Oscar), mas ao longo da demorada campanha até a premiação de ontem, o filme perdeu força, sendo atacado por ser um pouco arrastado, longo demais e contendo alguns erros históricos. O LADO BOM DA VIDA, um filme belíssimo e extraordinário, tinha grandes chances de ser eleito como o melhor do ano, com as atuações soberbas de Bradley Cooper, que também merecia levar o prêmio de Melhor Ator, e de Jennifer Lawrence, que desde que foram anunciadas as indicações saiu disparada como a favorita. A melhor atriz do ano de 2012, sem sombra de dúvida, é Emanuelle Riva, por sua grandiosa interpretação em AMOR, mas também já era do conhecimento de todos que o Oscar não iria reconhecer o seu trabalho premiando-a, por isso, então fiquei torcendo por Jennifer Lawrence, que acabou sendo laureada merecidamente. AS AVENTURAS DE PI é de uma beleza ímpar, seu maior mérito está exatamente nas imagens esplendorosas. Ang Lee mostra aqui novamente a sensibilidade de quem encantou o mundo com a história de amor entre dois cowboys norte-americanos em “O Segredo de Brokeback Mountain”. O filme transmite suas mensagens de teor religioso e humano com eficiência, em uma experiência que se revela rica não apenas no aspecto técnico. OS MISERÁVEIS, do diretor Tom Hooper, emociona plateias de vários países com uma brilhante adaptação do clássico de Victor Hugo. Em grande estilo, ele mergulha de cabeça num musical, trazendo para a tela uma adaptação do espetáculo que fez sucesso nos palcos do mundo todo. Hugh Jackman é um brilho exuberante com sua irretocável atuação e Anne Hathaway, favorita e premiada na categoria de atriz coadjuvante, é outro ponto alto do filme. Apostando na alta voltagem do drama de época, Tom Hooper investe em cenários altamente cuidados, movimentos constantes de câmera e closes nos rostos dos atores, que cantaram ao vivo durante as filmagens, aumentando a emoção das interpretações. Um dos grandes filmes do ano!! INDOMÁVEL SONHADORA - O grande destaque do filme é sem dúvida a atriz mirim Quvenzhané Wallis. Sua naturalidade é algo descomunal, e é o principal motivo de tudo parecer simplesmente realidade. Apesar de poucas falas, ela é a responsável por um tocante voice-over que, hora ou outra, expõe seus pensamentos distantes de nossa concepção, quase sempre pontuados por sentenças imperativas, um reflexo de sua existência movida a costumes e instintos de sobrevivência. É um filme excepcional, que se movimenta por caminhos diferentes, que levam principalmente à reflexão dos problemas de nossa sociedade, com suas diferenças e injustiças, nos fazendo entender a motivação dos sonhos daqueles que aparentemente não tem nada com que sonhar, que já nasceram sem alternativas. Mas contrariando este senso comum, os mesmos são carregados de esperanças, pelo menos enquanto crianças. Por fim DJANGO LIVRE, sempre com a direção notável de Quentin Tarantino. De todos os muitos prazeres catárticos de violência e humor que este divertido filme proporciona, ele ganha o espectador logo no começo, na hora em que Christopher Waltz bota o pezinho na frente para executar um bandido como se fosse um duelista da corte francesa – nenhum é maior do que ver Tarantino e seu ótimo elenco tentando sem medo, entre altos e baixos, encontrar uma linguagem visual e verbal que dê conta da recriação desse complexo mundo. A câmera é ora contemplativa (pastos, montanhas, pôr-do-sol), ora “spaghettiana” (os zooms forçados), dois extremos do western. Um grande filme que merece ser conferido!!

sábado, 26 de janeiro de 2013

INDOMÁVEL SONHADORA (Beasts of The Southern Wild) EUA, 2012


INDOMÁVEL SONHADORA (Beasts of the Southern Wild) EUA, 2012 – Direção Benh Zeitlin – elenco: Quvenzhané Wallis, Dwight Henry, Lowell Landes, Pamela Harper, Gina Montana, Henry D. Coleman – 93 minutos.

O diretor novaiorquino Behn Zeitlin tira do fundo da Louisiana uma história que funde documento, drama e fantasia: em tom documental, filmado quase sem refletores e em película 16 mm, o filme conta a história da pequena Hushpuppy, uma garota residente da Banheira, uma pequena comunidade em uma ilha cercada por águas agitadas que correm o risco de deixar a comunidade debaixo d’água na primeira tempestade forte. Embora o local seja fictício, inspira-se numa ilha real – a Isle de Jean Charles, já na parte da Louisiana que se mistura com o Golfo do México, e que a cada dia perde um pouco mais de espaço para o mar. Em comum, a Isle de Jean Charles e a “Banheira” têm a teimosia dos seus habitantes, que insistem em permanecer em suas casas mesmo com a água na canela. Junto com seu pai, Hushpuppy cresce se esforçando para sobreviver junto com seus vizinhos, todos pessoas perseverantes que adoram o local onde nasceram. Hushpuppy gosta de pensar em si e nos seus vizinhos como bestas da natureza selvagem, indivíduos fortes e de muita fibra moral; seus sonhos e devaneios são povoados constantemente por suínos imensos, peludos e com chifres. O roteiro é simples e funcional: lentamente somos levados a participar de um universo estranho e singular; com a fotografia naturalista em conjunto com seus poucos efeitos especiais para construir a atmosfera próxima porém absurda, o filme revela-se de uma narrativa nem um pouco pesada ou difícil de se assistir: seus personagens são empáticos, curiosos ou apenas engraçados o suficiente para que a conexão com o grande público seja estabelecida de forma rápida.



É com um atraso de sete anos que INDOMÁVEL SONHADORA (Beasts of The Southern Wild) chega para lavar a alma dos afetados pelo furacão Katrina, em 2005; mas o filme – vencedor do Grande Prêmio do Júri em Sundance e do Camera d’Or em Cannes – tira o atraso com impacto, numa mistura de fábula dickensiana com drama apocalíptico. Em 2008, o premiado curta do diretor - “Glory at Sea” – já tocava nos temas que seriam estendidos em INDOMÁVEL SONHADORA: a rotina dos moradores dos pântanos da Louisiana transformada em desamparo depois da passagem do furacão que fez transbordarem as águas do Estado. Antes ainda, em 2005, Benh Zeitlin fizera uma versão animada de “Moby Dick”, no seu curta-metragem de estreia “EGG”. Saber que o diretor novaiorquino – que vistou Nova Orleans pela primeira vez com a família, de férias, aos 13 anos – mantém uma relação de atração com os perigos do mar ajuda a entender o que INDOMÁVEL SONHADORA tem de potente.



O filme, formado por um elenco só de locais e cuja direção é assinada pelo coletivo Court 13, que Benh Zeitlin criou em 2004 em Nova Orleans para mover a produção de cinema independente local, não é um filme fácil. Seu ritmo lento e contemplativo se mostra distante dos grandes públicos, acostumados com algo mais palatável. O tom documental serve para transformar tudo em realidade, mesmo que fantasiosa. A câmera na mão, sempre em movimento, recorta cenas de maneira instigante, encontrando ângulos belíssimos e incomuns, repletos de luz na maior parte do tempo. O diretor iniciante oferece apenas reflexão com sua obra. Apesar da trilha sonora inspirada nos direcionar a um tom melancólico e dramático, o sentimento nunca se completa. Existe certa austeridade no filme, um contraste certamente irônico ao clima mágico estipulado. É realmente desagradável ver toda a sujeira em que estes seres humanos vivem, a forma precária com que se alimentam, a falta de educação etc. E é este incomodo o maior mérito de INDOMÁVEL SONHADORA, pois é ele que nos leva a tamanha reflexão. É um filme que nunca foge do horizonte de expectativas a que se propõe.



O grande destaque do filme é sem dúvida a atriz mirim Quvenzhané Wallis. Sua naturalidade é algo descomunal, e é o principal motivo de tudo parecer simplesmente realidade. Apesar de poucas falas, ela é a responsável por um tocante voice-over que, hora ou outra, expõe seus pensamentos distantes de nossa concepção, quase sempre pontuados por sentenças imperativas, um reflexo de sua existência movida a costumes e instintos de sobrevivência. O roteiro de Lucy Alibar, em parceria com o diretor Zeitlin, traz simplicidade em sua estrutura, mas se torna complexo devido a ambientação geral. A trilha sonora de Dan Romer, também em parceria com o diretor, é muito importante para o resultado final. Resumindo, é um filme excepcional, que se movimenta por caminhos diferentes, que levam principalmente à reflexão dos problemas de nossa sociedade, com suas diferenças e injustiças, nos fazendo entender a motivação dos sonhos daqueles que aparentemente não tem nada com que sonhar, que já nasceram sem alternativas. Mas contrariando este senso comum, os mesmos são carregados de esperanças, pelo menos enquanto crianças.


quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

O EXÓTICO HOTEL MARIGOLD (The Best Exotic Marigold Hotel) Reino Unido, 2011


O EXÓTICO HOTEL MARIGOLD (The Best Exotic Marigold Hotel) Reino Unido, 2011 – Direção John Madden – elenco: Judi Dench, Maggie Smith, Dev Patel, Bill Nighy, Tom Wilkinson, Penelope Wilton, Norman Cousins, Ronald Pickup, Celia Imrie, Tena Desae – 124 minutos.

O terreno cinematográfico está sempre preparado para as comédias ou para os dramas, e ainda mais para a mistura de ambos. Mas a jovialidade é, na maioria das vezes, garantida como certa. A atração do público é mais por gente nova, por caras mais jovens. Normalmente, quando a terceira idade aparece em algum gênero de comédia ou drama é como uma subtrama, sem nunca se colocar a frente do foco principal. Obviamente, algumas exceções fogem a essa regra, e aqui podemos colocar o novo filme de John Madden. O EXÓTICO HOTEL MARIGOLD aposta exatamente na terceira idade inglesa dialogando com o contemporâneo, descobrindo e se descobrindo a cada cena que se passa. Um dos segredos do diretor é trabalhar com elenco de reputação acima de qualquer suspeita, o que é fácil aqui, já que a própria necessidade da história, adaptada de romance de Deborah Moggach, requer a escalação de veteranos.



Nós costumamos viver a vida apoiados sempre na ilusão de que ela é eterna. Ignoramos qualquer sinal que nos lembre que nosso tempo por aqui é limitado e rechaçamos com veemência qualquer referência ao assunto. Talvez isso explique o papel marginalizado ao qual submetemos os idosos na nossa sociedade: de certa forma eles são lembretes ambulantes do destino que tanto nos empenhamos em ignorar. Assim, constantemente relegamos essas pessoas a um cruel beco sem saída, no qual elas devem aceitar que seu tempo já passou, que já é tarde para pensar em produzir ou conquistar qualquer coisa que seja e que lhes cabem apenas esperar calados o derradeiro fim de suas vidas enquanto nós cuidamos dos afazeres e inconvenientes até lá. Abordar esta complexa questão de maneira sensível é o que o filme oferece de melhor. Traz a história de sete idosos ingleses, cada um com seus conflitos, que viajam para a Índia e se hospedam no hotel do título, um lugar que se diz especializado em receber pessoas de idade avançada. Oferecendo um primeiro ato eficiente que nos apresenta em sequências intercaladas seus personagens, o diretor John Madden consegue captar sutilezas que demonstram a maneira cruel com que tratamos os idosos. Em determinado momento, por exemplo, um vendedor de casas aponta corrimãos e alarmes como uma indiscutível vantagem em sua oferta ao casal interpretado por Bill Nighy e Penelope Wilton, denunciando que os enxerga como dois incapazes. Em outro, o filho da personagem de Judi Dench decide levá-la para morar com ele sem consultá-la antes. Ou ainda quando o simpático velhinho interpretado por Ronald Pickup é imediatamente rejeitado por uma mulher em função de sua idade.



Trazendo cenas locais que indiscutivelmente embelezam e dão charme ao filme, a fotografia trabalha numa lógica simples e eficaz ao desenvolver o contraste de cores entre os atos do filme. Se a Inglaterra surge mais fria e escura, evocando não somente o clima como também o estado desencontrado de seus personagens, a Índia traz um aspecto bem mais colorido e quente, focando a vivacidade daquele país e a jornada dramática vivida por aquelas pessoas. No entanto o filme peca em exacerbar a desorganização do país para gerar situações cômicas, o que denota um reprovável sentimento de superioridade inglesa por parte de seu diretor. O elenco transborda talento. Servindo como centro emocional para aqueles personagens, Judi Dench investe numa serenidade típica de avó ao encarnar uma viúva que decide finalmente tomar as rédeas da própria vida, ao passo que Bill Nighy explora a doçura e gentileza de um homem que se esforça ao máximo para sempre ver o melhor lado das coisas, apesar da negatividade de sua mulher. E se Dev Patel parece acreditar que correr e falar apressadamente é suficiente para encarnar a angústia do rapaz que dirige o estabelecimento, Tom Wilkinson traz aquela que é a figura mais densa e interessante do filme: um homem atormentado que retorna à Índia para encarar seu passado. Já Ronald Pickup e Celia Imrie usam com eficiência seu pouco tempo em tela não só para serem bons alívios cômicos como para dar relevância à busca pelo amor, mesmo em idade avançada. Finalmente, a excelente Maggie Smith tira leite de pedra ao driblar um roteiro que impõe uma improvável transformação em sua personagem. A velhice não pode ser vista como uma mazela, afinal dentre todas as alternativas de futuro ela com certeza é a mais otimista. UM FILME DIVERTIDO E QUE ARRISCA NA EXPLORAÇÃO DA MELHOR IDADE COMO PROTAGONISTA!! MERECE SER DESCOBERTO E APRECIADO!!



terça-feira, 22 de janeiro de 2013

VIOLETA FOI PARA O CÉU (Violeta Se Fue a Los Cielos) Chile, 2011


VIOLETA FOI PARA O CÉU (Violeta Se Fue A Los Cielos) Chile, 2011 – Direção Andrés Wood – elenco: Francisca Gavillán, Thomas Durand, Christian Quevedo, Gabriela Aguilera, Roberto Farías, Marcial Tagle, Juan Quezada, Sergio Piña, Daniel Antivilo, Pedro Salinas, Ana Fuentes – 110 minutos.

Um mergulho na vida de Violeta Parra, o maior nome da música chilena. Esta cinebiografia conta a história de mais uma artista incompreendida, que quis a todo custo espalhar e ensinar a sua arte. Uma mulher que teve tudo o que quis, de amantes mais jovens ao reconhecimento de mineiros e políticos chilenos, passando pela burguesia cultural francesa, tudo foi alcançado por uma mulher insatisfeita por natureza e voluntariosa ao extremo.



Um filme absolutamente sensível e muito bem filmado, do chileno Andrés Wood, que encontra o equilíbrio entre a Violeta segundo a visão europeia e a Violeta chilena, que se interessava por cantigas das pessoas simples do interior de seu país e que, mais tarde, se tornou famosa no mundo todo - inclusive no Brasil, com gravações feitas por Elis Regina e Milton Nascimento. Ganhador de diversos prêmios, entre eles o de Melhor Filme de Cinema Mundial no Festival de Sundance 2012, VIOLETA FOI PARA O CÉU recupera a figura de uma das personalidades mais instigantes e importantes da América Latina. Poderia ser mais uma história de artista apaixonada e destruída, mas o diretor soube como trazer à tona as dores e artes de Violeta Parra, que encontrou na atriz Francisca Gavillán a sensibilidade necessária para uma investigação da alma feminina.



Francisca Gavillán se transfigura no papel de Violeta Parra, acompanhando algumas décadas na vida da artista. Sua transformação física a aproxima da personagem real, com maquiagem, figurinos e afins, mas é a compreensão do lado emocional que a atriz demonstra ter da artista que injeta densidade em sua bela interpretação. A própria Francisca canta com garra as músicas como se fossem dela mesma. Baseado no livro de memórias homônimo do filho da artista, Ángel Parra. O que ela vê em sua mente, e que dá estrutura ao filme, são flashes de sua vida, momentos marcantes, como a morte do pai, a apresentação itinerante de autos religiosos com a irmã, a apresentação na Polônia comunista, um conturbado romance com o músico suíço Gilbert Favre (Thomas Durand); e os últimos dias no seu centro de artes nos Andes. Os fragmentos são mostrados fora da ordem, ora seguindo a sequência cronológica, ora interrompidos por algum flashback do passado, da infância. No entanto, o arco narrativo nunca se torna confuso, pelo contrário, o passado ilumina o presente, que, muitas vezes, o reverbera. Aclamado entre os melhores filmes do ano, MERECE SER VISTO E REVISTO!!


sábado, 5 de janeiro de 2013

MOONRISE KINGDOM (Moonrise Kingdom) EUA, 2012



MOONRISE KINGDOM (Moonrise Kingdom) EUA, 2012 – Direção Wes Anderson – elenco: Jared Gilman, Kara Hayward, Edward Norton, Bruce Willis, Frances McDormand, Bill Murray, Tilda Swinton, Jason Schwartzman – 94 minutos.

A enternecedora e hilária história de dois adolescentes desajustados que tentam vivenciar um amor impossível, é o novo grande filme de Wes Anderson. Ele é um dos diretores mais originais do atual cinema mundial. Enquanto a maioria faz filmes realistas, e aí se incluem outros grandes cineastas, ele é um dos poucos capazes de criar um mundo próprio. MOONRISE KINGDOM é um filme cativante, principalmente para o público que curte histórias e personagens incomuns. Sua raridade excêntrica, no entanto, é também universalmente atraente e capaz de dialogar mesmo com o público mais afeito a tramas naturalistas e convencionais. É preciso certo desapego à realidade e capacidade de mergulhar sem hesitação em universos que transitam entre o crível e o totalmente surreal. Locais povoados de personagens nonsenses que, muitas vezes, beiram o ridículo, mas que criam identificação imediata com o público por exporem sem disfarces, e muitas vezes de maneira patética, aquilo que escondemos por trás das tolas convenções sociais.



Aqui, temos Suzy (Kara Hayward) que parece ser muito mais madura do que seus 12 anos de idade. Encontrar em cima da geladeira da família uma cópia do livro "Como Lidar Com Uma Criança Perturbada" é a gota d'água para que ela fuja de casa, juntando-se ao escoteiro Sam (Jared Gilman, em brilhante atuação), que conhecera tempos antes, quando ela participava, na igreja local, de uma ópera baseada na Arca de Noé. Essa ópera chama-se "Noye's Fludde" e foi criada por Benjamin Britten, no final dos anos 1950, para ser montada de forma amadora em igrejas. O coro é formado por animais da arca. Por isso, não é surpresa que haja um dilúvio iminente no filme, que sempre coloca os personagens em estado de alerta. O grupo de escoteiros usado no filme, na verdade, é uma sátira sutil ao militarismo. Por sinal, o filme, é pontuado de críticas perspicazes à sociedade moderna, mesmo sendo ambientado na década de 1960. A pequena ilha retratada funciona como um microcosmo do mundo, onde muitas de nossas incongruências se evidenciam de forma caricata.



Durante um bom tempo a produção se detém no jovem casal em fuga e suas descobertas. Os dois atores, ambos estreantes, estão excelentes e têm sintonia cênica perfeita. Os diálogos, por sua vez, são um destaque à parte. Quando se beijam pela primeira vez, numa das muitas sequências impagáveis do filme, ambientada na praia, Sam vira a cabeça e cospe. Em seguida, impassível, garante a Suzy que é só porque tinha areia na boca. Nestes momentos MOONRISE KINGDOM esquece da sátira e é apenas uma bela evocação do amor jovem e pueril, uma representação da América inocente. UM DOS MELHORES FILMES DO ANO!! OBRIGATÓRIO, INESQUECÍVEL E BELO!! A GRANDE SURPRESA DO ANO!!


terça-feira, 1 de janeiro de 2013

A RAINHA MARGOT (La Reine Margot) França / Alemanha / Itália, 1994

A RAINHA MARGOT (La Reine Margot) França / Alemanha / Itália, 1994 – Direção Patrice Chéreau – elenco: Isabelle Adjani (Margot) , Vincent Perez (La Môle), Daniel Auteuil (Henrique de Navarra), Virna Lisi (Catarina de Médicis), Jean-Hughes Angladé (Rei Carlos IX), Jean-Claude Brialy (Coligny), Miguel Bosé (Guise), Pascal Greggory (Anjou / Henrique III da França), Dominique Blanc (Henriette de Nevers), Thomas Kreschtmann (Nançay), Claudio Amendola (Coconnas), Asia Argento (Charlotte de Sauve); Julien Rassman (Alençon), Jean-Philippe Écoffrey (Condé) – 154 minutos. Este grande filme, um verdadeiro clássico do cinema francês, baseado na obra imortal de Alexandre Dumas (de 1844), retrata um período histórico marcado pela violência praticada em nome da fé e do amor. Com seu enredo emocionante e sua galeria de personagens memoráveis, A RAINHA MARGOT, é um filme fantástico e um dos mais belos e poderosos dos anos 1990. Causou grande impacto, pelas cenas de violência e de sexo. Lançado em 1994, foi aclamado no Festival de Cannes, dando a Virna Lisi o prêmio de Melhor Atriz por sua performance assombrosa, uma presença maligna e ambiciosa, que rouba todas as cenas do filme. Foi aclamada internacionalmente entre as melhores atuações de toda a história do cinema. Premiado também como Melhor Filme pela imprensa especializada. Ganhou cinco César (o Oscar francês).
A história se passa em 1572, quando as guerras de religião dilaceravam a França. Por conveniência política, uma princesa católica de dezessete anos - bela e culta, considerada a mulher mais fascinante de seu tempo - é obrigada a se casar com o rei protestante de Navarra, um pequeno país ao sul. Ela é Margarida de Valois, ou Margot, simplesmente; ele, o jovem Henrique de Navarra. Ao promover esse casamento sem amor, Catarina de Médicis, mãe da noiva e de Carlos IX, rei da França, espera obter a paz entre católicos e protestantes. Ocorre, porém, o contrário do esperado. Sobrevêm episódios terríveis, como a noite de São Bartolomeu, um dos massacres religiosos mais conhecidos de toda a história. No centro do conflito está Margot, interpretada pela grande musa do cinema francês, Isabelle Adjani, num papel que parece ter sido criado só para ela. Indiscutivelmente, A RAINHA MARGOT é o melhor filme já realizado sobre a histórica “Noite de São Bartolomeu”. Absolutamente belo e deslumbrante, é um filme histórico brilhante, com imagens delirantes e o mais arrebatador do gênero. Não existe na história do cinema, nada mais extraordinário sobre esse episódio sangrento da história.
A Noite de São Bartolomeu, massacre de mais de três mil protestantes, ocorrido em 24 de agosto de 1572, marca as sangrentas lutas religiosas que atrasaram a consolidação do absolutismo francês. Esse acontecimento caracteriza a fase final da dinastia Valois, que governava a França desde a Idade Média. O casamento forçado entre Margot, irmã de Carlos IX (rei da França) e o protestante Henrique de Navarra (Bourbon), não paralisou as lutas religiosas entre católicos e protestantes. Com a Noite de São Bartolomeu, ressurgia o combate, estimulado pelo Papa, envolvendo várias regiões européias. Com a morte de Carlos IX, sobe ao trono seu irmão Henrique III da França, iniciando-se uma guerra civil conhecida como “a Guerra dos Três Henriques”, entre Henrique de Guise, que fundou com líderes católicos franceses a Liga Católica e Henrique III, que contou com o apoio de seu cunhado Henrique de Navarra. Os dois últimos lideram o cerco sobre Paris em 1589, quando Henrique III é assassinado. Henrique de Navarra assume então o trono francês como Henrique IV, convertendo-se ao catolicismo – “Paris bem vale uma missa”, pronunciou a famosa frase – mas publicando o Edito de Nantes que dava liberdade de culto aos protestantes. Seu governo marca o início da dinastia Bourbon, que conhecerá o apogeu do Estado absolutista no longo reinado de Luiz XIV (1661-1715) o “rei sol”, para depois nos reinados de Luiz XV e Luiz XVI, conhecer a decadência e crise, que culminou com a Revolução Francesa em 1789, acontecimento que marca o início da Idade Contemporânea.
O filme mostra os propósitos do casamento, as tentativas da família real francesa de manter o trono em domínio de um rei católico, os amores proibidos da rainha e a perseguição aos protestantes durante a cerimônia do casamento. Este drama histórico poderoso também fala da manipulação dos homens; as tentativas fracassadas de assassinato; palavra em falso do outro que é dito para iludir e enganar; a lealdade a uma promessa de amor; a quebra de uma promessa de honra em nome de salvar a própria vida; o inusitado nascimento de um amor que pode render e salvar, mas que também pode dar a vida pela do outro. Há uma dissecação impecável sobre a vida de um nobre, onde muitas vezes o poder pode ser uma sentença de morte. Este épico assombroso repleto de suspense e beleza é interpretado por alguns dos melhores atores franceses de sua geração. Ao lado da impressionante caracterização de Virna Lisi e a estonteante atuação de Isabelle Adjani, temos ainda Vincent Perez, no auge sua beleza, numa impecável composição como o amante da Rainha Margot; o excelente Jean-Hughes Angladé brilha como o fraco Rei Carlos IX; Daniel Auteuil, como Henrique de Navarra dá um show particular; Pascal Greggory, como Anjou / Henrique III da França, dispensa comentários, numa magnífica representação; Miguel Bosé, brilhante como Guise está notável. Fotografado com grande beleza e precisão delirante por Phillipe Rousselot - que amplia a escuridão dos palácios e das ruas de Paris para reiterar as trevas que circundam as personagens – e com uma reconstituição de época impressionante e impecável (com ênfase no figurino indicado ao Oscar de Moidele Bickel), o filme conquista justamente pelos motivos que incomodaram os críticos sem abdicar dos elementos próprios de sua cinematografia (nudez frontal masculina ainda era um tabu em Hollywood) e absorvendo o melhor do cinema norte-americano, ele é um filme que serve tanto como entretenimento quanto como história, ainda que disfarçada de romance. OBRIGATÓRIO E BELO!!